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A cerca de um mês das próximas Eleições Legislativas, os vários partidos políticos concorrentes vão cumprindo com as etapas expectáveis do processo pré-eleitoral: foram aprovadas e entregues as listas dos candidatos a deputados pelos vários círculos; são montadas as estruturas de campanha e apresentados os respectivos orçamentos ao Tribunal Constitucional; vão sendo tornadas públicas as principais orientações das novas políticas governativas.
A cada um destes níveis, as incidências já conhecidas justificam algumas reflexões pertinentes, mesmo considerando, como parece verificar-se, que estes factores não são muitas vezes os mais determinantes para as decisões assumidas pelos eleitores na data do sufrágio eleitoral.
Ao nível das candidaturas, e cingindo-nos apenas aos dois principais partidos em compita, evidenciam-se duas tendências fundamentais.
Do lado do PSD, foi dada sequência ao processo de renovação dos quadros políticos iniciado com Manuela Ferreira Leite, ao mesmo tempo que se fez uma aposta no envolvimento crescente de personalidades independentes de créditos reconhecidos dos mais diversos quadrantes sociais e profissionais.
Do lado do PS, além do recrutamento de algumas figuras independentes no plano político, mas dependentes no quadro institucional das funções que exercem (de que se destaca o líder da AICEP, Basílio Horta), nota-se a aposta nos quadros políticos do núcleo duro da governação de José Sócrates.
Neste âmbito, não deixa de ser curioso que enquanto alguns procuravam valorizar a recusa de participação activa nestas eleições dos ditos senadores do PSD (ex-líderes e algumas das suas figuras de proa das últimas décadas), se procurasse escamotear a liquidação do “pilar dos pilares” da política do Governo dos últimos anos.
Depois de travar uma batalha titânica na defesa do indefensável em que se transformaram as opções políticas e financeiras do Governo Socialista, o Ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, não mereceu sequer o convite de José Sócrates para constar das listas de candidatos do Partido do Governo.
Ao prescindir de forma sumária do seu actual número dois, José Sócrates aproveitou para arranjar mais um bode expiatório para a visível degradação das condições económicas do País e para os incontornáveis sacrifícios que resultarão do financiamento externo.
Mais do que uma ilustração do carácter e do espírito de lealdade do Primeiro-Ministro ainda em funções, esta decisão deve ser lida como a mais clarividente auto-avaliação do trabalho realizado, de que Teixeira dos Santos foi apenas o rosto mais visível.
Relativamente às acções de campanha, a conjuntura de crise actual e a costela demagógico-populista da generalidade das forças partidárias, leva-as a assumir como desiderato a contenção dos custos e a redução das acções de promoção das candidaturas nos seus diferentes suportes.
Pessoalmente, desde que não sejam utilizados meios públicos para fins de promoção das candidaturas (que não por via das subvenções legais) e que as empresas públicas não sejam levadas a celebrar contratos de sponsorização de personalidades que se disponham a dar o apoio público a certos partidos, acho que não se deve cair em exageros.
As campanhas eleitorais são períodos nobres do exercício democrático e devem servir para que as várias forças em confronto façam chegar as suas mensagens aos eleitores, ajudando-os na decisão que irão tomar.
Ora, independentemente do seu custo, alguém pode avaliar de forma rigorosa o impacto efectivo (nessa perspectiva) de cada um dos suportes de comunicação utilizáveis, entre, por exemplo, um outdoor, um flyer, uma acção de rua ou uma sessão de esclarecimento público?
Levando esta lógica ao limite, não haverá até um custo de oportunidade associado à não veiculação de forma capaz das ideias de cada uma das candidaturas?
E, ainda do ponto de vista económico, se é verdade que muito do merchandising de campanha é hoje importado da China e países afins (admito mesmo que o material que o PS vai utilizar já estivesse encomendado há alguns meses), não é verdade que os períodos de campanha são também um tempo de dinamização de certos sectores da actividade económica (gráficas, empresas de comunicação e publicidade, designers, etc.)?
Resta, pois, abordar a questão do Programa Eleitoral. E se é visível que os eleitores tendem normalmente a prescindir da leitura dos programas eleitorais dos partidos/candidaturas e a agarrar-se a uma ou duas bandeiras mais repetidas durante a campanha, a verdade é que nas actuais circunstâncias, os programas vêem o seu protagonismo ainda mais reduzido.
De facto, ao invés de um leque alargado de opções políticas, estes Programas serão uma espécie de escolha múltipla entre as opções alternativas que os financiadores externos imporão como contrapartida.
E, sendo assim, é no mínimo um acto de honestidade política não avançar com qualquer programa formal antes de ser conhecido o resultado do trabalho e das negociações com a Troika externa.
Ao fazer de conta, como o PS fez na passada semana, que nada disso importa para os anos que virão, José Sócrates apenas está a ser coerente e a dizer aos Portugueses que nada do que ali está escrito deve ser tomado a sério, tal como sucedeu em 2005 e 2009.
Por isso, cumpre-me rejeitar as críticas de quem destacou que cerca de 30% das páginas do Programa Eleitoral do PS (entre títulos e separadores) estão em branco. Afinal, essas são as mais verdadeiras desse documento…
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