quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Os néscios que paguem a crise!


Como tantas vezes tenho escrito, inclusivamente neste espaço, os problemas mais graves da economia nacional (e, em paralelo, da gestão da coisa pública) arrastam-se de há muitos anos a esta parte e pouco ou nada têm a ver com as circunstâncias mais ou menos favoráveis da envolvente internacional.
Bem pelo contrário, foi por falta de vontade, por falta de visão, por falta de competência e, até, por falta de coragem, que vários Governos lidaram com displicência com esses obstáculos estruturais ao nosso desenvolvimento e que contribuíram para a amplificação das suas consequências, a um ponto que os torna hoje quase irresolúveis (pelo menos no horizonte de uma a duas gerações).
Desde a falta de uma estratégia para o nosso modelo de desenvolvimento económico à forma quase irresponsável (para não dizer criminosa) como se esbanja(ra)m recursos públicos e se condicionou a sustentabilidade futura do Estado – e não apenas do Estado social -, muitos foram os erros repetidos acumulados.
Em especial ao longo dos últimos 15 anos, com o pequeno intervalo da Governação Social Democrata de Durão Barroso, o acumular de erros e omissões é evidente e, tanto mais grave, incompreensível à luz do profuso debate público em torno destas questões e dos condicionalismos impostos pela nossa participação na União Europeia e na Zona Euro, em particular.
José Sócrates, o ainda Primeiro-Ministro e a pessoa que exerceu tal função nos últimos cinco anos, tem sido sustentadamente coerente na sua incoerência, verdadeiro na constante mentira, exímio na arte da ilusão.
Dele, desde cedo, os Portugueses puderam reter a certeza inabalável de que jamais hesitaria em sacrificá-los para prosseguir os seus objectivos, sem que ao mesmo tempo deixasse de prestar o seu apoio nas horas de dificuldades por que iriam seguramente passar, através do braço longo do Estado que, mais que confortar, se estende, estrangula e controla, ao serviço dos propósitos de quem manda.
Na sua petulante humildade, vimo-lo já apresentar múltiplas desculpas e explicações para inverter, sem hesitação nem decoro, inúmeros compromissos e verdades que antes dera por garantidas, jamais incluindo as suas acções e incúrias no rol de responsáveis pelo agravamento das condições económicas e sociais ou pela rotunda falha no cumprimento das metas políticas traçadas.
A ele, ao seu Governo de faz-de-conta, e ao seu extenso rol de acólitos, patrocinadores e dependentes, já lhe chamaram todos os nomes, dos publicáveis aos que constam na nova enciclopédia do calão, dos justos aos que pecam por defeito, dos que emergem naturalmente do seu catastrófico desempenho global aos que desvalorizam iniciativas meritórias concretas em alguns dos sectores-fetiche da governação.
Seja como for, algo se percebeu muito cedo. José Sócrates e o que resta do lado materialista, carreirista e Estado-utilitário do ex-Partido Socialista não servem para Governar Portugal, sendo responsáveis por algumas das maiores malfeitorias da nossa história nos tempos modernos.
A 22 de Junho de 2008, Portugal teve a oportunidade de renascer em Guimarães, com o início formal do mandato de Manuela Ferreira Leite à frente dos destinos do Partido Social Democrata.
Logo no discurso de encerramento do XXXI Congresso do Partido, a líder eleita frisou dois ou três pilares do discurso com que pautou o seu mandato e com que se apresentou às eleições legislativas de 27 de Setembro de 2009: o alerta para a “situação de emergência social”, a agenda de acção para “dar resposta aos focos de pobreza e apoiar os novos pobres”, a crítica à “vaga avassaladora de propostas de infra-estruturas que o Governo anuncia e de que o País nem sempre carece e para as quais manifestamente não tem dinheiro”, o compromisso de apoio “às pequenas e médias empresas que suportam o tecido empresarial”.
Mas este país não é para “velhos”. Nem para gente séria. Nem para quem fala verdade por menos simpáticas que as palavras possam parecer.
Aconteça o que acontecer com a aprovação do paupérrimo Orçamento de Estado para 2011 [cujo destino se desconhece na altura em que se concluem estas linhas], mas cujo conteúdo é quase irrelevante face às adversidades que o País enfrenta e ao escrutínio dos olhares internacionais, os portugueses podem ter duas certezas.
A primeira, é que o seu destino próximo só aparentemente vai continuar a ser traçado no Palácio de S. Bento ou na Assembleia da República, mesmo que o FMI queira conter custos e opte por não deslocalizar alguns quadros para o nosso País no imediato.
A segunda, é que esse futuro vai ser bem pior que o presente de sacrifícios com que já se deparam e muito pior que aquilo que seria se não se deixassem levar por canções de embalar.
Lamentavelmente, não são só os néscios que “pagarão a crise”. Somos todos nós.
E os que se nos seguirão.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Formar Empresários


Há já mais de uma década, a questão da qualificação dos empresários nacionais tem sido trazida para o debate público como um dos entraves estruturais a um superior desempenho da nossa economia.
Neste particular, cumpre ultrapassar uma primeira ambiguidade da questão, que se prende com a confusão de papéis entre os empresários (reais detentores do capital) e os gestores das empresas propriamente ditos.
No nosso país e, em especial, na franja dominante do tecido empresarial – as micro, pequenas e médias empresas – existe uma enorme coincidência destes papéis, o que é ainda agravado pela base familiar que suporta muitas dessas empresas.
Para quem conhece minimamente a realidade no terreno, é fácil perceber que além das lacunas incontornáveis que se podem detectar na baixa capacidade empreendedora e na diminuta cultura empresarial, o que verdadeiramente penaliza a actividade económica e a sustentabilidade das empresas é a falta de competências ao nível da gestão, sejam elas de natureza técnica ou no plano do relacionamento inter-pessoal.
Não há, em tal juízo, qualquer tipo de presunção intelectual. E, bem pelo contrário, há o reconhecimento expresso por aqueles que são capazes de alicerçar projectos de sucesso numa total dedicação às suas empresas, num sentido de negócio e de detecção de oportunidades extremamente apurado, no desenvolvimento de práticas informais de gestão que não poupam no rigor e que contribuem para a afirmação da competitividade e a garantia de rendibilidade desses projectos.
Todavia, é igualmente comum constatar que a generalidade dessas empresas, mesmo algumas que já possuem um número de trabalhadores e volumes de facturação consideráveis, utilizam ainda procedimentos incipientes ao nível do planeamento, orçamentação e controlo de gestão, revelando um estranho desconhecimento sustentado sobre aspectos decisivos para os seus negócios.
Em muitos casos, há igualmente uma falta de estudo abrangente sobre o enquadramento competitivo do seu sector ou produtos (ao nível dos anseios dos clientes, da dimensão do mercado, da actuação da concorrência e de diferentes dinâmicas que podem condicionar a sua viabilidade futura) e, o que é igualmente pernicioso, uma ausência de sentido estratégico na actuação da empresa.
Tantas e tantas vezes, o empresário/gestor e, por arrastamento, a própria organização desconhece ou não possui de forma explícita uma missão, uma visão, um conjunto de valores, um posicionamento e objectivos estratégicos a prosseguir num horizonte de curto e médio prazo (já que, cada vez mais, no longo prazo “estaremos mesmo todos mortos”).
E, como diz a razão popular, “não havendo ventos favoráveis para quem não sabe para onde vai”, não existindo planos de acções e correspondentes mecanismos de controlo que permitam ir ao encontro do cumprimento das inexistentes metas estratégicas, a gestão das empresas transforma-se numa verdadeira aventura náutica em pleno turbilhão do oceano económico mundial.
É claro que nada disto impede que, mesmo nessas circunstâncias, muitas empresas possam apresentar desempenhos positivos, até porque há mecanismos quase automáticos de defesa sempre que soam as campainhas de alerta de tempestade, normalmente orientados para políticas de contenção generalizada de custos que até se podem revelar contraproducentes (no investimento, no marketing, na formação, nos recursos humanos, …).
As oportunidades de melhoria são, porém, ainda muito significativas. E, reconheça-se também, há predisposição de muitos desses responsáveis empresariais para encetar/aprofundar processos de aprendizagem, ainda que tal abertura se tenda a restringir às intervenções sem custos, a expensas de financiamentos comunitários.
Aqui, se há também aqueles cuja visão e cujas práticas os fazem disputar a “Liga dos Campeões” das dinâmicas empresariais, as autoridades públicas não podem esquecer a esmagadora maioria dos que ainda só lutam “pela manutenção” e que ainda carecem desses estímulos públicos.
Há, todavia, algo que formação alguma pode incutir nesses empresários/gestores e que é tanto ou mais importante para o sucesso das suas empresas: o bom senso.