segunda-feira, 27 de abril de 2009

Os Fundos (ainda) no fundo


O Diário do Minho do passado dia 23 de Abril dava eco público das queixas dos formandos de Cursos EFA de três Escolas Públicas de Braga, que lamentavam os atrasos de vários meses no recebimento de subsídios inerentes a tais formações.
A título particular, tenho também tido informação de vários atrasos na transferência das verbas associadas a candidaturas aprovadas para formações financiadas de diferentes empresas e associações empresariais, pese embora a correcta instrução e tramitação dos processos., com o lógico atraso nos pagamentos a formandos e formadores.
Neste particular, quem quer que esteja envolvido na área da formação profissional e já tenha participado em acções de formação financiada, sabe que estes atrasos são prática corrente no “negócio”, decorrendo da necessidade de apreciação e processamento dos diferentes pedidos de pagamento das entidades que submeteram as candidaturas.
Todavia, a realidade actual parece ultrapassar os limites do razoável numa área em que o Governo assumiu um claro empenho e que tem funcionado como uma evidente panaceia para os desastrosos números do (des)emprego no nosso País.
Esta situação, intimamente associada à gestão Programa Operacional Potencial Humano (POPH), não é, porém, caso único.
Do lado das Autarquias Locais, são inúmeros os casos de Câmaras Municipais que ainda têm verbas consideráveis a receber de candidaturas aprovadas em diferentes Programas do III Quadro Comunitário de Apoio, cujo encerramento tem vindo a ser sucessivamente protelado face às datas inicialmente estipuladas.
Já no âmbito do QREN – Quadro de Referência Estratégica Nacional, os atrasos na transferência de verbas, ainda que mais compreensíveis, sã especialmente patentes nas áreas que têm merecido um maior nível de candidaturas por parte das Autarquias Locais, como é o caso do financiamento dos novos Centros Escolares.
Isto porque, como também salta à vista de quem acompanha estes processos, são muitas as áreas que ainda não procederam sequer à abertura de candidaturas para os diferentes beneficiários potenciais.
Na mesma linha, os apoios às empresas, em especial às Pequenas e Médias Empresas, são ainda um mero engodo, mais retraindo a parca vontade de investir dos empreendedores nacionais, como bem atestam as previsões para esta rubrica do PIB para o ano em curso.
Tal como em relação às demais entidades potencialmente beneficiárias, para lá dos prejuízos na óptica da concretização dos investimentos, há que considerar que os atrasos no pagamento das verbas contra despesa realizada traduzem mais um estrangulamento na tesouraria dessas empresas e entidades que, no caso dos agentes privados, pode pôr em causa a sua própria sustentabilidade financeira.
A tal efeito, acrescem necessariamente as repercussões negativas que tais atrasos podem ter sobre as empresas fornecedoras dos bens, serviços e empreitadas, que acabam por acomodar as dificuldades das entidades beneficiárias.
Por todos estes motivos, parece igualmente claro que haveria significativos benefícios económicos de um mais ágil e célere processo de apreciação das candidaturas aos diferentes Fundos Comunitários, não se percebendo que seja o Estado Português e os seus diferentes organismos que gerem estes processos uma das principais fontes de entraves a um superior grau de execução física e financeira dos Programas.
Ainda assim, se juntarmos a estas evidências os polémicos e incompreensíveis atrasos no arranque do QREN que, como é público, se reporta ao período 2007-2013, mas que tem ainda hoje, dois anos volvidos, uma incipiente execução, a perplexidade de qualquer observador independente aumentará exponencialmente.
Não valerá a pena, nessas circunstâncias, invocar a gestão política de vários processos de candidatura, as dúbias consignações de verbas do QREN a Investimentos públicos desajustados da realidade nacional ou os “vetos de gaveta”, como aqueles com que o Ministério da Ciência e Ensino Superior brindou a Universidade do Minho em várias candidaturas submetidas por esta Instituição.
Tudo somado, que o Governo não consiga dar corpo aos múltiplos anúncios de medidas de combate à crise para particulares e empresas com base em verbas do exaurido Orçamento de Estado é algo que parece natural face ao histórico das nossas Finanças Públicas.
Que, a essa luz, opte por esbanjar os benefícios associados a uma mais célere aplicação das verbas disponibilizadas pela União Europeia no contexto deste Período de Programação, é algo que raia os contornos da irresponsabilidade.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Mais Crise


À escala internacional, são já vários os Institutos de Pesquisa Económica, alguns dos quais bastante reputados, que assumiram a sua decisão de suspender a divulgação de projecções para os próximos trimestres, atendendo ao momento de especial incerteza que se vive na economia mundial.
E, atendendo à evolução recente das projecções para a economia nacional, quando ainda não atingimos um terço do ano de 2009, tal opção parece de todo avisada, em defesa da credibilidade de tais instituições.
Bem pelo contrário, seria de esperar que as entidades que não podem fugir a tal responsabilidade e a quem compete proceder à divulgação de dados periódicos sobre a evolução da economia nacional – veja-se o caso do Banco de Portugal – adoptassem uma postura de especial rigor e exigência, de forma a não transmitirem informações ou juízos erróneos para a generalidade dos agentes económicos.
Poder-se-á pensar que a economia tem de facto sofrido um processo de degradação acelerada que previsão alguma poderia antecipar.
Poder-se-á dizer que não convém que uma entidade como o Banco de Portugal assuma um discurso excessivamente pessimista, porque tal poderia induzir, por si só, uma superior retracção dos agentes económicos nas suas decisões de investimento e consumo.
Mas não se pode admitir que, à medida que cada uma das anteriores previsões vai sendo dilacerada pela realidade, o Governador do Banco de Portugal adopte um discurso que parece querer branquear a verdadeira amplitude da crise e escamotear as responsabilidades próprias da Governação no seu desenvolvimento e o fracasso das medidas de resposta à crise que vão sendo pomposamente anunciadas.
A esta luz, há factos que nos merecem seguramente uma enorme perplexidade.
Em Janeiro último, o Governo optou por submeter ao Parlamento um primeiro Orçamento Rectificativo tendo em conta a inversão das projecções e a estimativa de uma retracção do produto na ordem dos 0,8% no ano em curso.
Aquando da discussão desse documento na Assembleia da República, e tal como já acontecera com o Orçamento de Estado original no final de 2008, sobravam já as previsões de conceituadas organizações internacionais que apontavam para uma quebra no produto bastante superior (na ordem dos 1,6% do PIB).
De acordo com os dados do Boletim de Primavera do Banco de Portugal recentemente divulgados, a nova previsão de quebra do Produto Interno Bruto atinge os 3,5%, posicionando--se como a maior retracção após 1975 (quando o Produto caiu 4,3%).
Na base desta evolução está uma profunda quebra do Investimento e das Exportações (em mais de 14% cada) e de uma nova diminuição no Consumo Privado (em 0,9%). Como contrapartida positiva, registe-se apenas um aumento ligeiro do Consumo Público e uma diminuição das Importações em linha com o abrandamento da actividade económica.
Registe-se por exemplo que, em relação ao Investimento, o Governo estimara uma subida de 13% em 2009, pelo que os dados mais recentes atestam da quebra da confiança dos empresários e do artificialismo que ainda impende sobre muitos dos investimentos públicos anunciados.
Se esta evolução pode permitir uma melhoria da situação da nossa Balança Externa, aguarda-se com expectativa as repercussões que uma recessão desta dimensão poderá ter sobre os níveis do Desemprego e sobre o Défice das Contas Públicas.
A este nível, está também por explicar a hesitação do Governo em submeter um novo Orçamento Rectificativo, mais consentâneo com as previsões agora disponíveis.
Ainda segundo o Governador do Banco de Portugal, a recuperação da economia nacional está fortemente dependente da situação da Europa e dos demais Países desenvolvidos, sendo que não é previsível uma retoma significativa anterior a 2011.
Do outro lado da moeda destes dados, o mesmo Boletim da Primavera continha um artigo do meu amigo e colega de curso Nuno Alves, do Departamento de Estudos Económicos do Banco de Portugal, que sugeria que Portugal teria em 2006 cerca de dois milhões de pobres, dos quais 300 mil eram crianças.
Essa análise considera um indivíduo pobre se, num determinado período, o seu nível de rendimento (despesa) for inferior a 60% do rendimento (despesa) mediano em Portugal, fixando o limiar de pobreza num rendimento de 382 euros mensais em 2005, a preços desse ano.
O mesmo estudo conclui que as classes particularmente vulneráveis à situação de pobreza são as famílias em que pelo menos um adulto está desempregado, idosos com baixos níveis de educação, famílias compostas só com um adulto solteiro que não trabalha e que tem filhos e famílias numerosas em que pelo menos um adulto não trabalha.
Quantos serão agora?

terça-feira, 14 de abril de 2009

Ei-los que caem


Segundo os dados ontem revelados pelo INE – Instituto Nacional de Estatística, a taxa de variação homóloga do índice de preços no consumidor atingiu em Março um valor negativo, o que acontece pela primeira vez em Portugal desde o início da década de 60.
Ainda de acordo com a informação do INE, essa quebra atingiu o valor de -0,4%, sendo esta cifra inferior em 0,6 pontos percentuais face à que foi registada em Fevereiro último.
Embora, como também revela o INE, as séries não sejam totalmente comparáveis entre si, a verdade é que teremos que recuar quase cinquenta anos para encontramos uma situação idêntica na nossa economia.
Numa óptica de comparabilidade geográfica, mormente com os nossos parceiros da União Europeia, verifica-se que também o índice Harmonizado de Preços no Consumidor caiu no mês de Março, com o recuo a ultrapassar os -0,6%.
A ocorrência desta variação homóloga negativa dos preços em Março era vaticinada há já algum tempo pela generalidade dos analistas, embora se admitisse que ela pudesse ser menos expressiva.
Na verdade, esta diminuição do nível de preços irá reflectir-se na generalidade das economias mais desenvolvidas, sendo uma consequência directa da situação depressiva que estas atravessam. Na nossa vizinha Espanha, por exemplo, a inflação de Março anunciada há cerca de duas semanas, foi igualmente negativa.
Em termos sectoriais, tal como acontecera no mês de Fevereiro, a principal contribuição para a diminuição dos preços advém do sector dos Transportes, estando especialmente relacionada com a redução do custo dos combustíveis.
Por sua vez, comparando as taxas de variação homóloga de Março de 2009 com a média das taxas dos três meses anteriores, destaca-se a desaceleração de preços na classe das Bebidas alcoólicas e do tabaco, na classe dos Produtos alimentares e bebidas não alcoólicas, na Saúde
e na classe do Lazer, recreação e cultura.
Em sentido contrário, as classes da habitação, água, electricidade, gás e outros combustíveis, e dos Restaurantes e hotéis registaram uma subida, sendo que a variação mensal dos preços, de Fevereiro para Março, foi mesmo positiva, em 0,8%, e superior à variação nula observada entre Janeiro e Fevereiro.
Na base de tal resultado terá residido o contributo determinante da variação mensal observada na classe do Vestuário e Calçado, a qual, segundo o INE, “reflectirá a subida de preços associada ao fim da época de saldos e promoções e ao efeito da entrada da nova colecção de Primavera-Verão”.A confirmar-se esta subida mensal dos preços, estará de facto afastado o fantasma da Deflação – uma redução prolongada da inflação que pode redundar numa descida generalizada dos preços -, comummente temida pelos economistas como um factor ainda mais prejudicial que a própria inflação para o crescimento económico.
Há bem pouco tempo, o próprio Governador do Banco de Portugal assumiu a possibilidade de Portugal registar durante alguns meses uma inflação negativa, mas rejeitou, contudo, um cenário de deflação.
Além da situação verificada no preço dos combustíveis que, como convém lembrar, registaram novos máximos históricos em meados de 2008, a verdade é que as probabilidades de redução dos níveis de preços se estendem a outros sectores de actividade.
Afinal, num cenário recessivo como aquele em que nos encontramos, com uma forte retracção no consumo e no investimento, percebe-se que muitos dos sectores económicos registem um claro excesso de oferta face à procura, o que conduz inevitavelmente à descida dos preços.
Tanto mais que tal excesso de oferta decorre de um excesso de capacidade instalada, a qual não consegue retomar os seus níveis de equilíbrio apenas com base na falência de empresas ou nos despedimentos verificados.
Assim, essas empresas necessitam de escoar a sua produção, estando disponíveis para o poderem fazer a preços substancialmente mais baixos do que no passado recente.
Na óptica dos consumidores e investidores, perante a expectativa de novas baixas de preços, acumulam-se os estímulos para retraírem ainda mais a sua despesa, até porque poderão adquirir os mesmos bens e serviços a um menor preço dentro de algum tempo.
Estaríamos, pois, perante uma situação de difícil reversão, que funcionaria como causa e consequência do agravamento da situação depressiva.
Eles que subam, pois. Mas pouco, claro.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Um G-20 para o Século XXI

O G-20, ou Grupo dos 20, é um órgão informal que reúne periodicamente os Ministros das Finanças e os Governadores dos Bancos Centrais de dezanove dos mais importantes países industrializados ou em vias de desenvolvimento, versando sobre as matérias mais candentes da ordem económica internacional. O 20º elemento é a própria União Europeia, que surge representada neste fórum pela Presidência rotativa do Conselho Europeu e pelo Governador do Banco Central Europeu.
Desde 1999, data da sua constituição, o Grupo dos 20 promoveu já vários encontros de que resultaram importantes contributos para a ultrapassagem de dificuldades pontuais do sistema económico e financeiro mundial, bem assim como para a prossecução de outros objectivos comuns, como sejam o combate ao financiamento do terrorismo ou a imposição de padrões de especial transparência em matéria de fiscalidade ou de lavagem de dinheiro.
De uma forma geral, pode dizer-se que os esforços de cooperação internacional que resultaram deste organismo informal, assumiram um papel de relevo na ultrapassagem de crises económicas e financeiras recentes e, por esta via, contribuíram para a consolidação do crescimento económico mundial.
Sabendo-se da existência anterior de fora de discussão internacional que agregavam apenas as economias mais desenvolvidas, com especial relevo para o G-7, o G-20 conseguiu também o importante papel de aglutinar a tais discussões algumas das economias ainda em vias de desenvolvimento mas que, de há alguns anos a esta parte, vinham assumindo um claro protagonismo e pujança na cena económica mundial.
Assim, o G-20 é composto pelos representantes dos seguintes 19 Países: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos da América, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia. Como referido, junta-se-lhes, como membro de pleno direito a União Europeia.
Enquanto convidados, participam também nestas reuniões os responsáveis máximos e de alguns departamentos do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, na lógica de assegurar a devida articulação das conclusões do G-20 com os principais organismos económicos e financeiros mundiais.
Em termos meramente estatísticos, a importância deste fórum reflecte-se no facto de o G-20 agregar um conjunto de membros que representam as diversas regiões do mundo que, no seu conjunto, reúnem 90 por cento do Produto Nacional Bruto mundial, dois terços da população e 80% do comércio internacional.
Pese embora os méritos acumulados na sua ainda breve história, os líderes dos G-20 que, face à especial conjuntura mundial, marcaram presença na Cimeira de Londres, que teve lugar nos passados dias 2 e 3 de Abril, souberam estar à altura dos desafios que pendiam sobre os seus ombros, ao ponto de se poder considerar este encontro como verdadeiramente histórico.
Para tal, poder-se-ia relevar a capacidade de obter consensos dessa verdadeira “estrela pop“ da cena política mundial em que se transformou o Presidente Norte-Americano Barack Obama. Neste caso, com o especial mérito de assumir uma postura suficientemente construtiva para abdicar de algumas das propostas que assumiu, em conjunto com Gordon Brown – o Primeiro-Ministro Britânico -, no sentido de que se implementassem apoios orçamentais directos às economias de cada país, ideia essa que não mereceu o acolhimento da maioria dos membros.
Poder-se-ia igualmente destacar a “institucionalização” do peso da China, que surgiu nesta Cimeira não como um mero outsider com boas perspectivas de afirmação no futuro próximo, mas antes como uma economia liderante no contexto económico mundial. A este nível, registe--se que é do “cofre” Chinês que sai parte importante das verbas que vão financiar o plano de investimentos acordado, da mesma forma que houve alguma abertura dos responsáveis chineses para viabilizar o ataque aos paraísos fiscais.
Ainda, poder-se-ia vincar as “vitórias” alcançadas por líderes europeus como Sarkozy e Merkel que, conseguiram fazer prevalecer as posições que defendiam à partida e sobre as quais ameaçaram até vir a extremar posições.
Mas, mais do que as vitórias individuais, importa realçar as extraordinárias conquistas colectivas: na instituição de novos mecanismos de supervisão financeira; nos apoios ao desenvolvimento de um comércio internacional livre das amarras proteccionistas; nos estímulos ao crescimento económico mundial através da canalização de um importante volume de recursos financeiros; nos princípios adoptados para o combate aos paraísos fiscais.
Sob a capa dos novos equilíbrios e protagonistas que emergem à escala planetária, os líderes do Grupo dos 20 ecoaram também: “Sim, nós podemos!”.
E, se em linha com os compromissos agora assumidos, puderem assegurar, aquando de uma próxima reunião, que “Sim, nós fizemos!”, talvez as tradicionais manifestações contra a globalização se possam transformar em demonstrações pacíficas, de reconhecimento público pelo contributo para a prosperidade mundial.