terça-feira, 14 de abril de 2009

Ei-los que caem


Segundo os dados ontem revelados pelo INE – Instituto Nacional de Estatística, a taxa de variação homóloga do índice de preços no consumidor atingiu em Março um valor negativo, o que acontece pela primeira vez em Portugal desde o início da década de 60.
Ainda de acordo com a informação do INE, essa quebra atingiu o valor de -0,4%, sendo esta cifra inferior em 0,6 pontos percentuais face à que foi registada em Fevereiro último.
Embora, como também revela o INE, as séries não sejam totalmente comparáveis entre si, a verdade é que teremos que recuar quase cinquenta anos para encontramos uma situação idêntica na nossa economia.
Numa óptica de comparabilidade geográfica, mormente com os nossos parceiros da União Europeia, verifica-se que também o índice Harmonizado de Preços no Consumidor caiu no mês de Março, com o recuo a ultrapassar os -0,6%.
A ocorrência desta variação homóloga negativa dos preços em Março era vaticinada há já algum tempo pela generalidade dos analistas, embora se admitisse que ela pudesse ser menos expressiva.
Na verdade, esta diminuição do nível de preços irá reflectir-se na generalidade das economias mais desenvolvidas, sendo uma consequência directa da situação depressiva que estas atravessam. Na nossa vizinha Espanha, por exemplo, a inflação de Março anunciada há cerca de duas semanas, foi igualmente negativa.
Em termos sectoriais, tal como acontecera no mês de Fevereiro, a principal contribuição para a diminuição dos preços advém do sector dos Transportes, estando especialmente relacionada com a redução do custo dos combustíveis.
Por sua vez, comparando as taxas de variação homóloga de Março de 2009 com a média das taxas dos três meses anteriores, destaca-se a desaceleração de preços na classe das Bebidas alcoólicas e do tabaco, na classe dos Produtos alimentares e bebidas não alcoólicas, na Saúde
e na classe do Lazer, recreação e cultura.
Em sentido contrário, as classes da habitação, água, electricidade, gás e outros combustíveis, e dos Restaurantes e hotéis registaram uma subida, sendo que a variação mensal dos preços, de Fevereiro para Março, foi mesmo positiva, em 0,8%, e superior à variação nula observada entre Janeiro e Fevereiro.
Na base de tal resultado terá residido o contributo determinante da variação mensal observada na classe do Vestuário e Calçado, a qual, segundo o INE, “reflectirá a subida de preços associada ao fim da época de saldos e promoções e ao efeito da entrada da nova colecção de Primavera-Verão”.A confirmar-se esta subida mensal dos preços, estará de facto afastado o fantasma da Deflação – uma redução prolongada da inflação que pode redundar numa descida generalizada dos preços -, comummente temida pelos economistas como um factor ainda mais prejudicial que a própria inflação para o crescimento económico.
Há bem pouco tempo, o próprio Governador do Banco de Portugal assumiu a possibilidade de Portugal registar durante alguns meses uma inflação negativa, mas rejeitou, contudo, um cenário de deflação.
Além da situação verificada no preço dos combustíveis que, como convém lembrar, registaram novos máximos históricos em meados de 2008, a verdade é que as probabilidades de redução dos níveis de preços se estendem a outros sectores de actividade.
Afinal, num cenário recessivo como aquele em que nos encontramos, com uma forte retracção no consumo e no investimento, percebe-se que muitos dos sectores económicos registem um claro excesso de oferta face à procura, o que conduz inevitavelmente à descida dos preços.
Tanto mais que tal excesso de oferta decorre de um excesso de capacidade instalada, a qual não consegue retomar os seus níveis de equilíbrio apenas com base na falência de empresas ou nos despedimentos verificados.
Assim, essas empresas necessitam de escoar a sua produção, estando disponíveis para o poderem fazer a preços substancialmente mais baixos do que no passado recente.
Na óptica dos consumidores e investidores, perante a expectativa de novas baixas de preços, acumulam-se os estímulos para retraírem ainda mais a sua despesa, até porque poderão adquirir os mesmos bens e serviços a um menor preço dentro de algum tempo.
Estaríamos, pois, perante uma situação de difícil reversão, que funcionaria como causa e consequência do agravamento da situação depressiva.
Eles que subam, pois. Mas pouco, claro.

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