terça-feira, 5 de abril de 2011

A educação da criança


Logo agora que o grupo de música popular “Orquestra Chave d’Ouro” conseguiu familiarizar uma parte substancial da população com os acordes e a letra do hit que fez furor nos bailaricos de Verão e que poderia servir de música de fundo à generalidade das últimas campanhas eleitorais, os responsáveis políticos decidiram mudar o tom da discussão, muito em linha com a transformação social e cultural protagonizada pelo Governo (ainda) em funções.
Em bom rigor, se muitas das polémicas de anteriores actos eleitorais se prendiam com a “pesada herança” que os diversos Governos endossavam aos seus sucessores, hoje em dia é manifestamente inútil discutir a paternidade da criança.
Além dos últimos 6 anos - da era de José Sócrates, o Primeiro -, o Partido Socialista esteve à frente do Governo de Portugal em 13 dos últimos 16 anos, sendo fácil perceber que ele é o maior responsável (quase exclusivo, até) pela degradação da nossa competitividade económica, pelo agravamento das desigualdades sociais e pela diminuição da coesão territorial do País, pelo crescimento exponencial dos níveis de desemprego e pela calamitosa situação das nossas contas públicas.
Neste último aspecto, chega a ser confrangedor assistir à sucessão de declarações dos principais responsáveis do Governo e do PS, quando procuram alijar as suas responsabilidades nos sucessivos downgrades do rating da República (para níveis próximos do “lixo”, na perda de credibilidade do País junto dos mercados financeiros, na exponencial subida dos juros suportados pelos nossos financiamentos externos e pela iminente necessidade de recurso à ajuda externa para ultrapassar a grave crise financeira com que hoje nos deparamos.
Afinal, não há máquina de comunicação que possa iludir as evidências: as inúmeras revisões dos dados das contas públicas ao longo dos últimos anos, seja em termos previsionais, seja mesmo em termos de dados finais (como agora voltou a acontecer com a imputação dos valores já suportados com o processo BPN); a referida subida da dívida pública e da dívida externa do País (que, segundo dados do Banco de Portugal, representava já cerca de 230% do PIB no final de 2010); as dificuldades com que um número crescente de Portugueses e empresas se deparam no seu dia-a-dia, naturalmente agravadas por políticas erradas e erráticas na sua coerência e sentido estratégico.
Por tudo isto, é claramente estéril discutir quem é o “pai da criança”, sendo sobretudo pertinente olhar para o futuro e saber como a vamos preparar para enfrentar as dificuldades do mundo que a rodeia, para corrigir as suas deficiências e vícios ganhos nos anos mais recentes e para lhe devolver a esperança de uma vida melhor.
Neste âmbito, há claramente visões dissonantes. Há quem teime em seguir uma educação pela via da aprendizagem auto-didacta que tão fracos resultados tem proporcionado nos tempos mais recentes. Há quem sugira que deve retirar-se a tutela da criança ao seu pai e entregá-la ao padrasto para este optar sobre a melhor solução para a sua formação. Há quem defenda que a mesma deve ficar sob alçada do padrinho e que deve ser este a aproveitar os meios ao seu alcance e as suas competências económicas para acompanhar mais de perto o seu desenvolvimento próximo.
Há, também, quem opte pela via da frequência de um colégio externo, ou sob a batuta austera de uma Directora alemã, ou sob o signo do rigor de um Dean norte-americano ou, até, numa solução mista associada a um programa de intercâmbio global.
A este propósito, citam-se mesmo os exemplos dos colegas Grego e Irlandês, precursores deste modelo, dando nota de que as crianças sobreviveram ao embate e têm vindo a registar melhorias sensíveis nos seus resultados, ainda que beneficiando da consciencialização pública dos sacrifícios que seria necessário efectuar para inverter a situação.
Em Portugal, seguindo ainda a linha deste texto, há que ter consciência que, qualquer que seja o modelo por que se possa optar ou que venhamos a ser obrigados a implementar, é forçoso fazer um diagnóstico prévio das necessidades de aprendizagem da criança.
De uma vez por todas, é preciso conhecer-se toda a realidade e deixar de trabalhar para estatísticas ilusórias, com a agravante de apenas nos estarmos a iludir a nós próprios e a fazer retardar medidas que são incontornáveis.
Mesmo admitindo que os dados das contas públicas estão formalmente correctos, cumpre lembrar que há um vasto conjunto de encargos que aí não estão reflectidos por via das responsabilidades assumidas em sede de parcerias público-privadas, que terão que ser suportadas pelas gerações vindouras.
Pior, em virtude das normas estabelecidas para os perímetros de consolidação de empresas do Sector Empresarial do Estado e de outras entidades, há inúmeros défices que mais cedo ou mais tarde terão que ser incorporados nas contas públicas mas que não são hoje relevados pela contabilidade oficial.
Ao contrário do que parece ser a opinião dominante nos meios políticos, eu considero ser moralmente obrigatório proceder-se a uma real auditoria da situação financeira do Estado, a cargo de uma entidade ou de um grupo de peritos independentes, sob o eventual patrocínio da Presidência da República, cujo resultado devia ser conhecido antes das próximas Eleições Legislativas.
A educação da criança começa por se saber, com verdade, o que podemos esperar para o seu futuro.

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