segunda-feira, 2 de março de 2009

A adolescência do Euro


O Euro, não como nós o conhecemos das notas e moedas em circulação mas sobretudo enquanto unidade de conta, encontra-se a celebrar o seu décimo aniversário.
A 4 de Janeiro de 1999, a Moeda única passou a existir formalmente nos sistemas operativos dos mercados e instituições financeiras, seguindo-se um período de transição que se prolongou por mais três anos até à entrada da divisa em circulação.
Como alguns ainda se recordarão, a partir dessa data todas as transacções financeiras passaram a ser efectuadas em Euros, bem como a negociação de valores mobiliários e outras operações do mesmo cariz, enquanto que no “mercado real” se vivia o período da dupla afixação de preços.
A ultrapassagem desta efeméride tem vindo a suscitar várias iniciativas evocativas, desde debates a exposições como a que a União Europeia recentemente inaugurou em Braga sobre a primeira década da Moeda Única.
Na ocasião, a chefe da representação da Comissão Europeia em Portugal, Margarida Marques, e o Eurodeputado Silva Peneda efectuaram um balanço altamente positivo da existência do Euro, enaltecendo o seu peso económico e o seu contributo para o desenvolvimento recente da Europa.
A saber, por um lado, a Moeda Europeia é hoje utilizada por 16 dos Estados-Membros, correspondendo a uma população total que ultrapassa os 330 milhões de cidadãos. Por outro, terá estado na base de uma crescente estabilidade económica e de uma descida das taxas de juro e da inflação nos países aderentes, bem como contribuído para o crescimento e para o emprego.
Ora, partilhando genericamente a apreciação positiva então formulada, pode até parecer paradoxal apontar estes argumentos na actual conjuntura económica.
Afinal, se há algo que nenhuma economia da Zona Euro evidenciou ao longo dos últimos meses foi estabilidade económica, crescimento ou aumento do emprego. E, de igual forma, estamos longe de poder imputar ao Euro a recente descida abrupta das taxas de juro e as ameaças de deflação que hoje pairam sobre as economias desenvolvidas.
Isto é, se há verdade com que o Euro e os Países aderentes têm que se deparar à entrada da adolescência da divisa Europeia é que a sua existência não é um factor que garanta, de per si, a imunidade contra as vicissitudes da economia global. E, de forma mais abrangente, para o conjunto dos países-membros, nem sequer se pode dizer que o Euro foi um factor de amortecimento dos impactos dessa mesma crise.
Do que se pode depreender, recorrendo aos argumentos apresentados aquando da sua adopção, que a existência de uma moeda única é um elemento catalisador do crescimento nos períodos de expansão económica – pela maior facilidade das trocas de bens e serviços e pela maior mobilidade dos diferentes factores produtivos -, mas não tem o mesmo tipo de benefícios num contexto económico adverso.
Mais uma vez, claro está, quando se analisa o seu impacto sobre o conjunto da Zona Euro e não as implicações específicas da sua adopção para cada país específico. Isto porque, se olharmos por exemplo para a realidade nacional não é difícil admitir que se Portugal não estivesse enquadrado na Moeda Única há muito teria resvalado para uma situação de fragilidade económica e financeira ao nível das que viveu na década de 80, ficando sob o escrutínio do Fundo Monetário Internacional.
Ainda nessa óptica mais particular, e continuando a centrar-nos no caso português, parece também evidente o impacto inflacionista que a introdução do Euro teve na economia real, de que resultou uma diminuição do poder de compra doméstico. Já tentou converter em moeda antiga os preços dos seus bens de consumo corrente? Quanto custa hoje em escudos o seu pequeno-almoço, o seu jornal, o seu café?
Já numa óptica internacional, os membros da Zona Euro, e também os Portugueses, estão hoje mais ricos. A enorme valorização do Euro contra o dólar e as demais divisas de referência (ou a depreciação destas em relação ao Euro, se preferir) aumentaram o nosso poder de compra no exterior e a capacidade de importar bens e serviços.
É claro que esta situação tem como reverso da medalha a diminuição da competitividade dos nossos produtos no exterior (quando não internamente) e uma natural propensão para o aumento dos défices da Balança Comercial.
De um modo geral, abona a favor do Euro o facto de ter conquistado, de forma tão célere e cabal, um espaço preponderante no panorama económico e financeiro mundial, por ter consumado a sua adopção por todos os países aderentes sem qualquer tipo de sobressaltos operacionais e de ter afirmado a liderança do Banco Central Europeu no contexto da política monetária da União.
No mais, quase me apetece repetir o curioso desabafo de uma das muitas entrevistadas aquando da introdução do Euro em circulação, no início de 2002: “Euros ou Escudos, importante é que haja ele!”...

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