A descida do IVA
Por paradoxal que possa parecer, a decisão de descida da taxa do IVA que o Primeiro-Ministro tornou pública na pretérita semana teve tanto de surpreendente quanto de inevitável.
Surpreendente, porque contrariou totalmente o discurso (ainda recentemente utilizado) e a estratégia política de consolidação das contas públicas assumida por este Governo.
Inevitável, porque face às características da nossa economia, à conjuntura actual e ao comportamento dos nossos parceiros, em particular da vizinha Espanha, era impossível manter um tão significativo diferencial de taxas como o que estava em vigor.
É especialmente sob esses dois prismas de análise que se pode avaliar a recente iniciativa do Governo do Partido Socialista, mas não só.
Comecemos então pelo discurso e pela estratégia. Está hoje claro aos olhos de todos os Portugueses que os resultados alcançados por este Governo ao nível do controlo do défice orçamental, que potenciaram, como também recentemente foi divulgado, a obtenção de uma marca histórica nos valores de 2007, foi alicerçada num aumento sustentado das receitas fiscais e no esmagamento do investimento público, mais do que num efectivo controlo da despesa corrente.
Este aumento das receitas fiscais resultou de uma mais eficaz política de combate à evasão e à fraude fiscal, na linha do trabalho desenvolvido pelo anterior Director-Geral das Contribuições e Impostos, Dr. Paulo Macedo, mas sobretudo de uma efectiva subida da carga fiscal incidente sobre particulares e empresas (com o aumento do IVA, IRS e outros impostos sobre o consumo).
Doze dias antes da data do anúncio desta decisão, o mesmo Primeiro-Ministro afirmava convictamente que era “leviano e irresponsável falar em baixar impostos”, em resposta às propostas então formuladas pelo líder da Oposição.
É certo, lembrarão alguns, que José Sócrates acrescentou a tal expressão a ideia de que era necessário “conhecer em pormenor os dados da economia portuguesa do ano passado” e que, sublinhou, teríamos que estar “seguros de que tudo aquilo que ganhámos nestes últimos anos não será posto em causa”.
Mas alguém acredita que o Primeiro-Ministro e o Ministro das Finanças não tinham qualquer noção dos dados que depois vieram a ser divulgados? E que no dia 26 de Março é que ficaram com segurança sobre a solidez da descida do défice? É que mesmo que existissem dúvidas sobre o acerto final e que uma décima de PIB até represente verbas muito significativas, o que é que esse eventual diferencial garante em termos de sustentabilidade da consolidação orçamental?
Trata-se, obviamente, de mera estratégia eleitoral. E é extremamente provável que a taxa volte a descer pelo menos mais um ponto percentual em 2009, retomando os valores de 2005, porque o Primeiro-Ministro tem consciência que tem mais valor eleitoral dizer que desceu duas vezes a taxa do que promover já uma descida de maior amplitude.
Mas esta descida era igualmente inevitável por razões que se prendem com a competitividade do nosso tecido empresarial, quer interna quer externamente.
O IVA representa um pesado acréscimo sobre o valor dos produtos e serviços transaccionados, sendo particularmente crítico que o parceiro comercial com o qual temos um maior volume de trocas tenha uma taxa significativamente mais baixa.
Neste âmbito, as novas descidas só não serão irreversíveis se ocorrer qualquer ajustamento em alta da taxa do IVA do lado de lá da fronteira.
Sempre que se verifica este tipo de movimentos das taxas de um imposto sobre o consumo, coloca-se sempre a questão de saber quem serão os reais beneficiários da medida, se os consumidores, se os produtores/distribuidores.
E, por mais que o Governo ameace com o reforço da fiscalização, que os retalhistas reiterem o seu compromisso de descida de preços e avancem até com aquelas campanhas-tipo do “nós antecipámos a descida do IVA: não espere por Julho para ter todos os preços 1% mais baratos” (0,83% dos preços actuais, para ser mais rigoroso), não fiquem muitas dúvidas que esta medida reverte quase integralmente em favor das empresas, o que não é necessariamente mau.
A título de exemplo, para lá de problemas ligados aos arredondamentos dos novos valores, tendo por base os preços actuais, a mudança de preços é manifestamente impraticável pelo custo que a própria operação acarretaria na generalidade das superfícies comerciais.
A juntar a tudo isto, na mediática análise da variação do custo dos cabazes-base de uma qualquer família-tipo, valerá a pena lembrar que há bens e serviços cuja taxa de incidência do IVA é inferior aos actuais 21% da taxa normal.
Em suma, esta é uma daquelas medidas que, sendo intrinsecamente positiva, também aparenta mais do que é, e pode ser jogada como trunfo eleitoral, sem que da mesma revertam especiais benefícios para o bem-estar concreto dos cidadãos.
E essa é uma questão que, cada vez mais, urge colocar na agenda governativa.
Surpreendente, porque contrariou totalmente o discurso (ainda recentemente utilizado) e a estratégia política de consolidação das contas públicas assumida por este Governo.
Inevitável, porque face às características da nossa economia, à conjuntura actual e ao comportamento dos nossos parceiros, em particular da vizinha Espanha, era impossível manter um tão significativo diferencial de taxas como o que estava em vigor.
É especialmente sob esses dois prismas de análise que se pode avaliar a recente iniciativa do Governo do Partido Socialista, mas não só.
Comecemos então pelo discurso e pela estratégia. Está hoje claro aos olhos de todos os Portugueses que os resultados alcançados por este Governo ao nível do controlo do défice orçamental, que potenciaram, como também recentemente foi divulgado, a obtenção de uma marca histórica nos valores de 2007, foi alicerçada num aumento sustentado das receitas fiscais e no esmagamento do investimento público, mais do que num efectivo controlo da despesa corrente.
Este aumento das receitas fiscais resultou de uma mais eficaz política de combate à evasão e à fraude fiscal, na linha do trabalho desenvolvido pelo anterior Director-Geral das Contribuições e Impostos, Dr. Paulo Macedo, mas sobretudo de uma efectiva subida da carga fiscal incidente sobre particulares e empresas (com o aumento do IVA, IRS e outros impostos sobre o consumo).
Doze dias antes da data do anúncio desta decisão, o mesmo Primeiro-Ministro afirmava convictamente que era “leviano e irresponsável falar em baixar impostos”, em resposta às propostas então formuladas pelo líder da Oposição.
É certo, lembrarão alguns, que José Sócrates acrescentou a tal expressão a ideia de que era necessário “conhecer em pormenor os dados da economia portuguesa do ano passado” e que, sublinhou, teríamos que estar “seguros de que tudo aquilo que ganhámos nestes últimos anos não será posto em causa”.
Mas alguém acredita que o Primeiro-Ministro e o Ministro das Finanças não tinham qualquer noção dos dados que depois vieram a ser divulgados? E que no dia 26 de Março é que ficaram com segurança sobre a solidez da descida do défice? É que mesmo que existissem dúvidas sobre o acerto final e que uma décima de PIB até represente verbas muito significativas, o que é que esse eventual diferencial garante em termos de sustentabilidade da consolidação orçamental?
Trata-se, obviamente, de mera estratégia eleitoral. E é extremamente provável que a taxa volte a descer pelo menos mais um ponto percentual em 2009, retomando os valores de 2005, porque o Primeiro-Ministro tem consciência que tem mais valor eleitoral dizer que desceu duas vezes a taxa do que promover já uma descida de maior amplitude.
Mas esta descida era igualmente inevitável por razões que se prendem com a competitividade do nosso tecido empresarial, quer interna quer externamente.
O IVA representa um pesado acréscimo sobre o valor dos produtos e serviços transaccionados, sendo particularmente crítico que o parceiro comercial com o qual temos um maior volume de trocas tenha uma taxa significativamente mais baixa.
Neste âmbito, as novas descidas só não serão irreversíveis se ocorrer qualquer ajustamento em alta da taxa do IVA do lado de lá da fronteira.
Sempre que se verifica este tipo de movimentos das taxas de um imposto sobre o consumo, coloca-se sempre a questão de saber quem serão os reais beneficiários da medida, se os consumidores, se os produtores/distribuidores.
E, por mais que o Governo ameace com o reforço da fiscalização, que os retalhistas reiterem o seu compromisso de descida de preços e avancem até com aquelas campanhas-tipo do “nós antecipámos a descida do IVA: não espere por Julho para ter todos os preços 1% mais baratos” (0,83% dos preços actuais, para ser mais rigoroso), não fiquem muitas dúvidas que esta medida reverte quase integralmente em favor das empresas, o que não é necessariamente mau.
A título de exemplo, para lá de problemas ligados aos arredondamentos dos novos valores, tendo por base os preços actuais, a mudança de preços é manifestamente impraticável pelo custo que a própria operação acarretaria na generalidade das superfícies comerciais.
A juntar a tudo isto, na mediática análise da variação do custo dos cabazes-base de uma qualquer família-tipo, valerá a pena lembrar que há bens e serviços cuja taxa de incidência do IVA é inferior aos actuais 21% da taxa normal.
Em suma, esta é uma daquelas medidas que, sendo intrinsecamente positiva, também aparenta mais do que é, e pode ser jogada como trunfo eleitoral, sem que da mesma revertam especiais benefícios para o bem-estar concreto dos cidadãos.
E essa é uma questão que, cada vez mais, urge colocar na agenda governativa.
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