quarta-feira, 24 de junho de 2009

O Manifesto dos 28

A situação já era de estranhar. Depois de em períodos anteriores de alguma turbulência económica se terem multiplicado os Manifestos, Movimentos e Convenções da Sociedade Civil, o que estaria a reter essa mesma “Sociedade” de tomar posição na actual conjuntura?
Estariam os mais reputados economistas, empresários e demais personalidades fazedoras de opinião a perscrutar a realidade para elaborar um diagnóstico mais racional da actual situação e para antever a sua mais provável evolução futura?
Estariam já a estudar as melhores soluções para contornar os actuais problemas e para avançarem com medidas concretas de dinamização da actividade económica?
Pois bem, se é que existia alguma expectativa em torno desta matéria, o “Manifesto dos 28” que foi tornado público no decurso do passado fim-de-semana, acaba por ser algo decepcionante.
Por um lado, por força do leque de subscritores envolvidos. Entre os 28, encontram-se de facto economistas de todos os quadrantes políticos, de reputação e prestígio inatacáveis, cuja agregação numa determinada tomada de posição pública não pode ser desvalorizada e deveria ter repercussões efectivas sobre as linhas de orientação das políticas de quem quer que esteja a exercer funções Governativas.
Assim sendo, uma tomada de posição desta natureza justificar-se-ia quando a mesma pudesse ter um impacto efectivo na reorientação dessa linha de condução das políticas e não num momento em que, como defendi em anterior artigo, por força da actual perda de legitimidade “política” o Governo se deveria abster de tomar decisões que possam condicionar decisivamente as gerações vindouras e a acção dos próximos Executivos.
Perante tal pressuposto, o “Manifesto dos 28” parece surgir desenquadrado no tempo, dando óbvia credibilidade pública a uma determinada opinião sobre as matérias abordadas, mas perdendo o seu efeito prático entre as irredutibilidades do actual Governo e as tentativas de mitigação, hoje evidentes, do seu sentido de perda do anterior capital eleitoral.
Numa outra perspectiva, o “Manifesto dos 28” também chega tarde, uma vez que centra as suas conclusões na necessidade de reavaliação pelo Governo dos grandes investimentos públicos e no apelo para que faça um travão imediato nos projectos de transportes.
Na base destas conclusões está a ideia que “os desequilíbrios estruturais que atingem a economia portuguesa, que têm vindo a piorar na última década e que se agravaram com a crise mundial, não são compatíveis com a insistência em investimentos públicos de baixa ou nula rentabilidade, e com fraca criação de emprego em Portugal".
Ora, em verdade, não foi esta a linha de discurso utilizada pela actual Direcção do PSD desde os primeiros dias do seu mandato?
Não foi esta posição menorizada, ignorada, ridicularizada e duramente criticada pelos mais diversos quadrantes durante meses a fio em que se tornava evidente que o País não podia desperdiçar recursos com investimentos de rentabilidade duvidosa? Especialmente em circunstâncias como aquelas que hoje marcam o cenário económico e social, em que o grosso dos meios financeiros tem que ser orientado para medidas que criem emprego e prestem apoio aos mais carenciados?
Não era isto, então, cultivar a inacção? Não era sinónimo do desperdício dos apoios comunitários para estes projectos? Não era uma incoerência face às posições assumidas pelos anteriores Governos do PSD e pela Própria Dra. Manuela Ferreira Leite? Mas as políticas devem manter-se imutáveis às transformações da realidade do País?
No “Manifesto dos 28”, diz-se, agora, o óbvio: é preciso parar, pensar e reequacionar estes projectos. E, para isso, claro está, é preciso fazer estudos.
Ora, só a demagogia barata de Francisco Louça é que pode tentar achincalhar esta posição com o envolvimento de alguns dos subscritores nos estudos anteriormente realizados e nas posições assumidas por este e anteriores Governos sobre a matéria.
Não sabe este prestigiado economista que os estudos são feitos com pressupostos e cenários que não são imutáveis?
Estará apenas a defender que quem realize actividades de consultoria para o Estado deve trabalhar gratuitamente?
Estará ele próprio disponível para efectuar os estudos que agora se revelam necessários, a título pro-bono?
Em suma, o “Manifesto dos 28”, pode ter menos impacto do que a junção destas personalidades deveria justificar, chega tarde e diz o óbvio.
Mas, ao dizer o óbvio, fala verdade. E isso basta.

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