segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Mudar de vida


Ao longo das últimas semanas, na qualidade de Vereador na Câmara Municipal de Braga, promovi várias reuniões e contactos informais com diversas estruturas sindicais, organismos públicos, dirigentes de associações empresariais, instituições de cariz social e empresários deste Concelho.
De uma forma geral, o balanço foi idêntico, pesado e negro, temendo-se um claro agravamento da situação económica e social no futuro próximo.
Para lá do que as notas oficiais de cariz partidário podem transcrever, ficam os desabafos, as inconfidências, os alertas para uma acção determinada que possa pelo menos suster o impacto deste verdadeiro tsunami económico em que Portugal sofre muito mais que as ondas de choque dos abalos internacionais.
“-Isto vai morrer, doutor! Isto vai morrer…” – dizia-me ainda ontem um empresário de relevo do mais pujante sector económico local.
“-Sabe qual é o volume de trabalhadores que está a pedir para receber em dinheiro vivo, de maneira a que os seus salários não possam ser automaticamente retidos pelos Bancos em que estão em incumprimento?” – perguntava-me outro há dias.
“-Ninguém paga a ninguém! Estamos perante uma enorme bola de neve em que mesmo os poucos negócios que existem são virtuais…” – voltava a lamentar-se o primeiro.
“-O doutor imagina o que é ver uma família de aparentes posses, com estatuto na sociedade, a passar forme e com vergonha de pedir apoio? Fome, mesmo. De comer dia sim, dia não ou de ter que esperar pela nossa ajuda…”- atirava-me uma responsável de uma IPSS.
Desempregados, no concelho de Braga, são mais que 8.000. No Distrito, a taxa de desemprego sobre para os 14%. No Centro de Emprego de Braga (que agrega os concelhos de Vila Verde, Amares e Terras de Bouro) há mais de 2.500 jovens licenciados inscritos.
Dos vários milhares de jovens que concluem a sua formação superior a cada novo ano, são cada vez mais os que partem para o estrangeiro, em busca de melhores alternativas, que se mudam para as duas grandes metrópoles do Continente ou que se dedicam a actividades indiferenciadas (como Caixa de Hipermercado, Lojista, Motorista, para lá de outras ocupações de cariz administrativo, na indústria, restauração e hotelaria ou na construção civil).
Será que a culpa está nas Universidades? Essas “gastadoras” que nem dinheiro têm para manter as instalações abertas todo o ano?
Mesmo os empregos existentes são exemplos-vivos do badalado “trabalho precário”. Baixos salários, horários exigentes, pouco vínculo, quase nenhumas perspectivas de carreira. Novos tempos. E não vale a pena culpar as leis por isso ou pensar que vai ser diferente tão cedo.
“-Sabe, por força das dificuldades de inserção no mercado de trabalho e da ausência de um mercado de arrendamento, são cada vez mais os jovens que ficam a morar com os pais até idades avançadas, muitas vezes para lá dos 30 anos, hesitando em constituir família.” – frisava também um responsável de uma instituição de cariz social.
“Pior. Face ao enorme nível de incumprimentos dos créditos à habitação, são cada vez mais os casais que entregam as suas casas para pagamento das dívidas ao Banco e que voltam a morar com os progenitores.” – acrescentava um bancário presente.
No âmbito da formação, lamenta-se a falta de visão estratégica, o esbanjamento de fundos em acções sem capacidade de reforço das qualificações ou da empregabilidade dos formandos, centradas em áreas de intervenção com reduzidas saídas profissionais.
Ao nível central, pergunta-se que Estado é este que diminui o investimento, mormente em dotação de recursos humanos, a uma estrutura como o Centro de Emprego numa altura em que o seu movimento mais que terá duplicado? E como justificar a incapacidade de dar resposta aos projectos concretos que poderiam ser a bóia de salvação para algumas centenas de profissionais?
E que Estado é este que cria crescentes dificuldades burocráticas e administrativas ao nível da Segurança Social no acesso às prestações sociais dos trabalhadores quando estes mais precisam?
Ao nível local, faltam espaços de discussão informal entre todos os parceiros económicos e sociais. Falta criar rotinas de colaboração, monitorização e acção, que não se cinjam às horas de aperto em que dificilmente se vão encontrar soluções milagrosas.
E falta, seguramente, quem assuma a liderança. Quem diga basta. Quem inverta as prioridades tradicionais e coloque verdadeiramente as pessoas em primeiro lugar. Quem desenvolva todos os esforços para proteger os mais carenciados e para dar apoio aos mais capazes e empreendedores.
Quem tome consciência de que só com uma vida digna, com um rendimento capaz, com um emprego e com perspectivas de futuro é que se pode desfrutar dos passeios na Avenida ou das peladinhas nos renovados sintéticos do Concelho.
Tudo o mais, são promessas vãs de votos de fim de ano que mal se ouvem enquanto a banda tocar…
A todos os leitores dos Suplementos, um óptimo ano de 2009.

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