domingo, 18 de setembro de 2011

O bom rebelde

As incidências que envolvem a afirmação académica (ou profissional) e social de alunos provenientes de meios económicos e sociais mais sensíveis, é um dos temas mais apetecíveis da literatura e, por inerência, da cinematografia mundial.
Mais ou menos romanceada ou dramatizada a situação, a questão essencial centra-se normalmente em torno do desafio colocado ao protagonista quanto à sua conduta nesses contextos, tendo em conta uma questão essencial: será ele capaz de se libertar dos condicionalismos desse background pessoal, aproveitar as suas capacidades e afirmar-se como igual ou superior à generalidade dos demais?
Ou deverá acomodar-se ao seu “destino” e alinhar com os seus pares, muitas das vezes em condutas impróprias, abdicando de lutar por um futuro melhor?
Feitas as devidas ressalvas, é porventura essa a situação com que se depara hoje Portugal. Mais do que saber se queremos ou poderemos voltar a ser os “bons alunos” da Europa, importa saber o que pretendemos, como País, para o nosso futuro.
À margem das discussões de natureza político-partidária em volta das opções governativas tomadas, do apetite mediático que certas medidas podem suscitar ou das reacções críticas que as mesmas podem induzir em certos segmentos da população, há uma questão de base que nunca é devidamente enfatizada.
Por muito que seja fácil fazer um discurso contra a especulação financeira, as políticas dos “ricos da Europa” – cuja conduta está longe de poder ser elogiada neste processo -, ou contra a usura das entidades Europeias e/ou internacionais, a verdade é só uma: o esforço de disciplina das finanças públicas é ele próprio um requisito essencial para garantir a sustentabilidade do crescimento económico futuro, não sendo possível pensar na aposta nesse crescimento sem garantir o equilíbrio financeiro do Estado (e do Pais).
Pense na sua situação como agregado económico, individual ou familiar. Por via dos seus rendimentos ou de património acumulado dispõe de um conjunto de activos para fazer face às suas necessidades correntes e futuras e para cumprir com eventuais responsabilidades que tenha assumido perante terceiros.
Se o volume de encargos e responsabilidades seguir uma tendência crescente e insistir em superar os referidos rendimentos, entrará numa espiral de empobrecimento que pode conduzir a uma situação insustentável.
No mínimo, os custos financeiros que suportar com os financiamentos que contrair para obstar a esse défice periódico traduzem-se numa despesa espúria, não reprodutiva, tanto mais gravosa quanto a própria despesa que origina esse défice não estiver associada a investimentos indutores da criação de riqueza.
Nessa circunstância, valerá a pena criticar aqueles que exigirão retornos agravados por força do risco que assumem em financiá-lo numa situação de debilidade visível? Terá legitimidade para exigir que o continuem a financiar mesmo sabendo que é evidente que não terá capacidade para solver os seus compromissos (assumidos e a assumir)?
A nível nacional, a situação é muito idêntica. Desde logo porque, por força da diluição da informação, da insuficiência do conhecimento técnico e da leitura ligeira dos factos, há um certo sentimento de inimputabilidade, quase colocando em dúvida se um eventual incumprimento terá reais consequências ou, o que é equivalente, consequências mais gravosas do que aquelas que são sensíveis no decurso do processo de ajustamento.
Dito de outra forma, para o comum dos Portugueses coloca-se uma questão muito simples: seria pior para a sua situação pessoal deixar o défice público disparar, rasgar o acordo com a Troika e abdicar da política de rigor orçamental ou sofrer as consequências das medidas preconizadas nesse acordo e implementadas ou a implementar pelo Governo nos próximos anos?
Por mais que custe a perceber, a situação na primeira hipótese seria incomparavelmente pior, com consequências pessoais muito mais gravosas do que aquelas que hoje são sentidas pela generalidade da população.
Este é, pois, o caminho. O único caminho. O caminho que garante uma pequenina janela de oportunidade que ainda permite ter alguma esperança num futuro melhor.
Como nos livros e nos filmes, o “Bom rebelde” está sempre sujeito aos seus instintos de revolta pessoal e aos maus conselhos de quem acha que não há solução e que tudo deve continuar como está.
Mas há também aqueles que o apoiam e o querem ver singrar contra todas as adversidades.
Muitas das vezes, o primeiro passo para o seu sucesso é saber destrinçar com clareza quem são as boas e as más companhias.

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