sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Democracia Económica (I)


Em Abril último, no congresso que formalizou a sua eleição como líder do Partido Social Democrata (PSD), Pedro Passos Coelho anunciou a criação de uma Comissão para a Revisão do Programa do PSD.
Iniciou-se então um projecto, coordenado por José Pedro Aguiar-Branco, que envolve a realização de múltiplos debates e sessões públicas, reuniões de órgãos internos, plenários de militantes e o recurso a um vasto leque de plataformas de comunicação que visa maximizar a participação neste processo de revisão do Programa.
Como se pode ler no preâmbulo do Programa do PPD – Partido Popular Democrático, aprovado em Novembro de 1974, “o Programa do Partido não pode ser nem um simples conjunto de medidas concretas articuladas entre si de modo a esboçar uma política de governo, nem tão-pouco um agregado de expressões utópicas ou de carácter demagógico”.
Com efeito, não se pode confundir um Programa de Partido com um Programa Eleitoral ou com um Programa de Governo, porquanto estes últimos devem traduzir as iniciativas, as propostas, os caminhos que materializam em concreto, em cada momento, os fins e ideais que o primeiro preconiza, no respeito pelos valores e princípios que o dito Programa do Partido assume como genéticos e diferenciadores.
A este nível, quer se atente à versão original do programa, quer à revisão de 1992, o PSD sempre se assumiu como um partido reformista, humanista, personalista, interclassista, que coloca como fim último da sua actuação um “projecto de transformação estrutural da sociedade”, com uma “larga e corajosa visão de futuro”, centrado no “combate às desigualdades sociais” enquanto instrumento para construir uma “sociedade mais livre, justa e humana”, em que se promova a “igualdade de oportunidades” e se corrijam os “desequilíbrios a nível pessoal e regional” e se garantam “os direitos económicos, sociais e culturais”.
A justiça e a coesão social, a coesão territorial, um liberalismo moderado que reconhece que “o Estado deve evitar a tentação de tudo fazer, abrindo espaço à saudável iniciativa dos cidadãos e dos grupos” são assim valores que coexistem historicamente no Programa e na acção do PSD com a postura dialogante e o respeito pela concertação social, com o princípio da afirmação da sociedade civil, com o empenho no processo de construção europeia ou com a valorização da Lusofonia.
No plano estritamente económico, o conceito da Democracia Económica sempre conviveu com os objectivos de colocar a “política económica ao serviço do povo português” ou de sustentar “uma economia de mercado orientada para o desenvolvimento económico e social”.
Aqui, se o Programa de 1974 acabava por contrariar um pouco o espírito do preâmbulo, avançando com uma exaustiva enunciação de acções a desenvolver em cada um dos sectores de actividade económica, a versão de 1992 aligeirou o conteúdo mantendo a essência da visão Social Democrata.
Assim, sustenta-se que “a economia deve ter como base a propriedade e iniciativa privadas” numa “lógica de mercado”, mas não excluindo a intervenção do Estado quer enquanto agente regulador, quer enquanto elemento de correcção para as falhas do mercado ou no quadro do desenvolvimento de políticas que salvaguardem o “interesse nacional”.
Orientadas para estimular o crescimento económico e a correcção das desigualdades, as políticas económicas devem ter especial atenção às vertentes da poupança e do investimento, a dirigir prioritariamente para “as áreas educacional, social e infra-estrutural”, sendo esta última centrada no incentivo ao investimento privado e no reforço da eficiência produtiva.
Ainda no Programa de 1992, nota para a ênfase atribuída ao papel da empresa na sociedade – “um instrumento de realização humana e de progresso económico e social” -, para a importância reconhecida à “dignificação do trabalho e do trabalhador”, nomeadamente através do “reconhecimento da competência, do mérito e da valorização profissional” e para a assunção da meta prioritária da “distribuição socialmente equitativa da riqueza”, através da colaboração activa com o sector da economia social.
Se estes valores são imutáveis, a realidade não o é, justificando o reconhecimento de novas preocupações e desafios que devem estar na primeira linha da actuação do Partido aquando da assunção de qualquer tipo de responsabilidades governativas, de cariz nacional, regional ou local.
Razão pela qual voltarei a abordar este tema, daqui por uma semana, a título de contributo para o processo de revisão em curso.

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