quinta-feira, 4 de março de 2010

Instabilidade. E crescimento?


Com as discussões finais do Orçamento de Estado para 2010 ainda a terem lugar nas diferentes Comissões da Assembleia da República, as atenções do país económico já se voltaram para o Programa de Estabilidade e Crescimento para 2010-2013 que o Governo irá submeter a Bruxelas.
Desta feita, as expectativas são ainda mais elevadas, tendo em conta o esforço adicional que será exigível para poder dar resposta à derrapagem orçamental de 2009 e à prossecução dos objectivos de fazer convergir rapidamente a nossa situação orçamental para os limites estabelecidos no seio da Zona Euro.
Em bom rigor, a situação não é muito diferente da que o País tem enfrentado praticamente desde a sua adesão ao Euro. Se, por um lado, é claro que o défice orçamental é hoje muito superior ao verificado no início da década, não deixa também de ser verdade que o nosso País continua a ser dos piores mas a média da “turma” também se degradou e os seus congéneres europeus enfrentam situações bastante menos confortáveis do que então.
A outro nível, e pese embora as melhorias verificadas neste período em matéria de aumento da eficácia da máquina fiscal, constatamos que os níveis de receita são ainda insuficientes e estão fortemente penalizados pelo agravamento das condições económicas do País.
Do outro lado da balança, pese embora os múltiplos anúncios de reformas estruturais em curso ou já concluídas nos mais diversos domínios, verifica-se que a despesa pública continua a registar um crescimento voraz, muito superior ao nível da receita obtida, por razões que são alternativamente imputadas aos diferentes subsectores do Estado.
A esta luz, o novo Programa de Estabilidade e Crescimento volta a ter que dar resposta a esta equação inevitável de um qualquer sistema contabilístico: como reduzir à despesa e/ou aumentar as receitas para promover um maior equilíbrio das Contas Públicas?
Por diversas ordens de razões, e pese embora os apelos velados que um e outro vão deixando à materialização de tal iniciativa, as condições para que se verifique um agravamento fiscal significativo são diminutas e terão sempre custos políticos, sociais e económicos relevantes.
Quanto às despesas, para lá do congelamento ou até a redução de salários dos funcionários e gestores públicos [para que alguns admitem já a realização de uma Revisão Constitucional extraordinária], parece inevitável uma nova reforma da segurança social (que alargue o tempo de vida útil do trabalhador) e alterações nas opções políticas na saúde, na educação, na justiça e demais serviços públicos, ao mesmo tempo que se reequacionam prioridades e calendários dos investimentos.
Estes são, compreenda-se, os caminhos mais fáceis e aqueles que podem dar uma resposta mais imediata (ainda que não necessariamente mais consistente) aos anseios e apreensões de várias contrapartes internacionais: da própria União Europeia, às malfadadas Agências de Rating, até à generalidade dos investidores.
Note-se, porém, que estes caminhos pecam pelo excessivo experimentalismo e pela falta de uma linha de rumo clara, que carece de uma superior conciliação das visões para o futuro do País da parte da generalidade das forças partidárias e, em particular, daquelas que se perfilam como suporte potencial de qualquer Governo.
Talvez por isso, na instabilidade constante desta “navegação à vista de costa”, o Programa de Estabilidade e Crescimento acabe por descurar uma outra componente fundamental, ela própria facilitadora do cumprimento das metas orçamentais: a promoção de um crescimento económico sustentado, alicerçado em vantagens competitivas assumidas e reforçadas, numa estratégia de desenvolvimento coerente e ambiciosa.
Ora, tal omissão impede inclusivamente que haja uma resposta mais capaz ao problema do desemprego no País, à exígua capacidade de inserção no mercado de trabalho de jovens licenciados, até à falta de estímulos ao empreendedorismo dos cidadãos.
Com a particularidade, não negligenciável, desse crescimento económico potenciar o aumento das receitas por via fiscal e a diminuição da despesa, pela menor necessidade de accionar os mecanismos de protecção social.
Mais vale, pois, esperar o pior e preparar o cinto para mais um aperto…

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