terça-feira, 11 de novembro de 2008

A falência do Banco de Portugal


Quando há algumas semanas se vivia o “aparente” epicentro da crise financeira internacional e começaram a surgir as primeiras notícias sobre a falência de instituições financeiras de firmados créditos nos mercados internacionais, os responsáveis do Governo e do Banco de Portugal foram taxativos: “-Não há risco de contaminação desta crise ao sistema financeiro nacional.
Ora, por paradoxal que tal possa parecer quando acabamos de assistir à falência e posterior nacionalização de uma instituição bancária no nosso País – o BPN – Banco Português de Negócios -, a verdade é que, pelo menos em termos de efeitos directos, esses responsáveis terão falado verdade.
Isto é, ninguém admite hoje que os factores que estiveram na origem da estrondosa derrocada do BPN e que poderão pôr em risco outras entidades de pequena, média ou grande dimensão em Portugal têm a ver com a mesma natureza de motivos que desencadearam o recente terramoto nos mercados financeiros mundiais.
E, em bom rigor, assim acontece. Como há muito vinha sendo pressentido (até publicamente) e como agora foi intensamente propalado, as dificuldades do BPN, primeiro de natureza estrutural (económica e financeira) e, depois, de natureza conjuntural (com problemas de falta liquidez), resultaram de erros de gestão, tanto mais graves quanto muitos terão estado associados a práticas alegadamente ilegais, prolongadas no tempo.
A saber, e baseando-me apenas nas declarações dos responsáveis públicos, os mais de 700 milhões de Euros de prejuízos acumulados à data terão resultado de “excessiva exposição a produtos de risco” e de “operações de crédito clandestinas”, o que terá levado o BPN a “deixar de cumprir com os seus rácios de solvabilidade”.
A progressiva saída dos recursos captados junto de particulares e institucionais e as dificuldades na concretização do Plano de Recuperação gizado por Miguel Cadilhe – que assumiu a Presidência do Banco em Junho último – já tinham obrigado o BPN a contrair em Outubro um empréstimo no valor de 200 milhões de euros junto da Caixa Geral de Depósitos para fazer face a uma situação de falta de liquidez grave.
Ao longo das últimas semanas, perante a impossibilidade de concretização de parte do aumento de capital que constava do “Plano Cadilhe”, a Administração do BPN (ou da Sociedade que detém a maioria do seu capital) tentou proceder à alienação do Banco a outras instituições de crédito nacionais, bem como sensibilizar o Governo para a eventual injecção de capitais públicos que reequilibrassem a situação financeira da instituição, mas nenhuma dessas iniciativas terá sido bem sucedida.
Chegou-se assim ao fatídico dia 2 de Novembro e ao anúncio de nacionalização do BPN, enquanto “melhor alternativa para defender os interesses dos depositantes da instituição” e para suster as réplicas deste terramoto no conjunto do sistema financeiro nacional.
De então para cá, seguiram-se a dura Conferência de Imprensa de Miguel Cadilhe – a rejeitar a solução adoptada e a apontar a “grave e demorada falha de supervisão”-, a trapalhona iniciativa Governamental de aprovar uma Lei Geral para Nacionalizações como anexo de um processo concreto e os múltiplos reparos da Oposição, uns mais extremados que outros, mas especialmente centrados na figura do Governador do Banco de Portugal.
Se recuarmos alguns meses, as primeiras notícias sobre pedidos de esclarecimentos do Banco de Portugal ao BPN surgiram em finais de 2007, ao que se seguiram processos de contra-ordenação que culminaram nas saídas de José Oliveira e Costa, em Fevereiro de 2007, e Abdool Vakil, em Junho último.
Em Maio, foram responsáveis superiores do BPN a denunciar a pretensa prática de “crimes financeiros”, enquanto que, logo após a sua tomada de posse (e segundo notícia do Expresso de Agosto), Miguel Cadilhe terá imposto a adesão a uma espécie de convénio de rejeição de todo e qualquer tipo de práticas e produtos de legalidade duvidosa. Tarde demais, porém.
Sucede que uma das funções cometidas ao Banco de Portugal é “garantir a estabilidade e a solidez do sistema financeiro, de modo a assegurar a eficiência do seu funcionamento, a segurança dos depósitos e dos depositantes e a protecção dos consumidores de serviços financeiros”. É para isso que existe um “Departamento de Supervisão Bancária”.
Ora, antes de se avançar com o pedido de demissão do Governador, que pode mudar a capa mas não a essência das práticas da supervisão bancária em Portugal, a sucessão próxima de ocorrências como as que se deram no BCP e, agora de forma bem mais grave, no BPN, aconselhariam a realização de uma Auditoria de Procedimentos imediata a este Departamento.
É que, na actual conjuntura, o mesmo não contribui apenas para a cabal prossecução das funções cometidas ao Banco de Portugal. Antes, ele deve mesmo assegurar a confiança dos cidadãos no Sistema Financeiro, nas Autoridades de Supervisão e poupar umas centenas de milhões de Euros aos contribuintes em circunstâncias como a que agora se verificou.

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