segunda-feira, 7 de maio de 2007

Vive la France!


Para lá dos 61 milhões de franceses que acompanharam com elevado interesse e participação as várias etapas das Presidenciais francesas, o desiderato do acto eleitoral do passado Domingo colhia as atenções de parte substancial da Comunidade Internacional.
Afinal, apesar do período recente de estagnação relativa e de especiais dificuldades na esfera económica, nomeadamente ao nível das taxas de desemprego, a economia francesa continua a ser a terceira mais importante da União Europeia (UE) e a sexta maior a nível mundial.
Ao longo dos últimos anos, a França tem demonstrado particulares dificuldades para ultrapassar certos bloqueios estruturais, apresentando uma taxa de crescimento do Produto real média anual de 1,5% - uma das mais baixas da UE -, uma taxa média de desemprego de 9,4%, um ainda elevado défice das suas contas públicas e um crescente défice da sua balança comercial – que resulta da contínua perda de competitividade externa.
A médio prazo, serão precisamente estes os principais desafios do novo Presidente Sarkozy e da equipa de Governo que será nomeada proximamente, faltando saber se o mesmo terá o esmagador apoio angariado numa das mais participadas eleições de sempre para as duras reformas que é necessário encetar nos próximos meses.
No seu discurso de vitória, Nicolas Sarkozy deixou claros os princípios que regerão a sua actuação futura: “o Presidente do trabalho, da autoridade, da moral e do respeito”, condimentados aqui e além pela defesa dos valores da “tolerância, da liberdade, da democracia e do humanismo”.
Sob esta capa aparentemente conciliadora, que até acolhe o respeito pelas ideias da sua adversária, terá que avançar uma profunda transformação do modelo social francês – um dos ícones do modelo social europeu -, que assentará numa ampla revisão da legislação laboral.
Na década de 90, o crescimento económico da França levou o então Governo socialista a avançar com a semana das 35 horas, pressupondo que a redução dos horários de trabalho permitiria o aumento das ofertas de emprego, o que jamais veio a acontecer.
Em contrapartida, se a França mantém o domínio estatístico da produtividade horária por trabalhador, a redução do número de horas de trabalho reduziu drasticamente a produtividade por trabalhador no cômputo geral, posicionando-a em valores 20% abaixo dos resultados dos Estados Unidos e atrás do Luxemburgo, Bélgica e Irlanda, de entre os membros da União Europeia.
De igual forma, o produto per capita francês encontra-se ainda acima da média da União, mas significativamente atrás das cifras apresentadas pelos Estados Unidos e Japão e por vários parceiros da franja mais desenvolvida da UE (como o Luxemburgo, a Irlanda, a Dinamarca, a Áustria, a Holanda, o Reino Unido, a Suécia, a Bélgica e a Finlândia).
Ao longo desta campanha eleitoral, Sarkozy assegurou que irá tomar medidas para contornar o impacto das 35 horas, reforçando as possibilidades já introduzidas em 2005 no sentido de permitir que quem quiser possa trabalhar mais que esse horário, recebendo a justa compensação por isso. Neste caso, prevê-se a introdução de incentivos fiscais quer para as empresas, quer para os trabalhadores abrangidos.
A par da legislação laboral, a fiscalidade foi também um dos principais cavalos de batalha desta peleja entre a direita e a esquerda francesa, com Sarkozy a assegurar que irá baixar os impostos sobre as empresas (hoje, com um valor médio de 33,3%) e sobre os particulares (até 4% em 10 anos), estabelecer um tecto de 50% para a tributação das fortunas e reduzir a tributação sobre as heranças. O IVA desceu já para os 19,6% desde o ano 2000.
Com estes eventuais cortes do lado da receita, a consolidação das contas públicas terá que incidir sobre o lado das despesas, áreas em que a França se tem deparado com gastos crescentes quer no aparelho administrativo do Estado, quer em áreas como a Saúde ou a Segurança Social.
Aqui, tal como acontece nas demais economias desenvolvidas, o problema demográfico pode assumir peso determinante, com a taxa de crescimento anula média da população a cifrar-se nos 0,4% anuais.
A curto prazo, a França de Sarkozy terá também que enfrentar o inexorável desafio da resposta a dar à Imigração e às classes mais desfavorecidas da população, como os quase três milhões de pessoas que vivem nos vários “guetos” urbanos que envolvem as principais cidades do País, com elevados focos de delinquência e violência ocasional.
Tal como acontece no nosso Pais, os dados globalmente negativos parecem ser continuamente desmentidos pela performance das grandes empresas, que acumulam lucros crescentes e que assumem um papel dinâmico em diversos palcos da economia internacional: o CAC-40 mantém-se em terreno positivo desde o início do ano e a França posiciona 10 dos seus “champions” no ranking das 50 maiores empresas europeias.
De volta à noite de Domingo, Sarkozy afirmou também “o regresso da França à Europa” e assegurou a recuperação da “ligação Atlântica”, expressando um maior alinhamento com os Estados Unidos, sem esquecer a necessidade de constituir uma verdadeira “União Mediterrânica”.
No rescaldo deste acto eleitoral, é ainda cedo para perceber se a França vai conseguir libertar-se da “malaise” (mal-estar) que se instalou na sua sociedade ao longo dos últimos anos e que, por arrastamento, tem perturbado as suas funções de motor económico da Europa e do Mundo.
Mas, em benefício próprio, só nos resta esperar que assim seja.

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