terça-feira, 13 de março de 2007

Combater a Corrupção



O combate à corrupção é hoje um dos temas de maior pertinência na vida pública das sociedades modernas, à medida que surgem evidências da generalização destas práticas em todos os quadrantes de actividade.
Do desporto aos meios empresariais e financeiros, dos responsáveis políticos aos funcionários públicos de base, são muitos os que caem na tentação de optar pela auto-estrada do facilitismo e da ilegalidade para atingir determinado tipo de benefícios pessoais ou para obter favorecimentos para os grupos que representam.
Nas suas diferentes formulações jurídicas, os actos de corrupção vêm minando a credibilidade das instituições e dos próprios regimes democráticos, configurando também um grave prejuízo para o desenvolvimento da actividade económica e para o bem-estar das populações.
Neste caso, não estamos necessariamente a cingir-nos a Portugal e a melhor evidência que se pode contrapor a tal preconceito é o facto de as próprias Nações Unidas terem promovido várias iniciativas neste mesmo domínio.
Entre outras, destacam-se necessariamente o Dia Internacional contra a Corrupção, que agora se comemora no dia 9 de Dezembro de cada ano, e que é em si mesmo uma referência à assinatura da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, que ocorreu na cidade mexicana de Mérida em 9 de Dezembro de 2003.
Nessa data, mais de uma centena de Países – em que se incluía Portugal - assinaram a Convenção, comprometendo-se a realizar acções eficientes contra a corrupção, “transformando a teoria em prática, num esforço contínuo que deve envolver os Governos, a sociedade civil e o sector privado”.
Em Setembro de 2005, o Director dos Programas Globais do Instituto do Banco Mundial, Daniel Kaufmann, publicava na revista trimestral do Fundo Monetário Internacional – Finance and Development -, os resultados de um estudo da instituição que sugere que o combate à corrupção pode até triplicar o rendimento per capita de alguns países.
No artigo “Dez mitos sobre a governação e corrupção”, Kaufmann assegura que iniciativas que melhorem os graus de “controlo e corrupção” de um dado País podem potenciar, entre outros benefícios, significativos incrementos do rendimento das populações, fazendo com que um país como Portugal pudesse atingir os níveis de rendimento da Finlândia.
Ainda segundo este autor, esta melhoria da governação serviria também para corrigir certas entropias no funcionamento das economias e da gestão pública, as quais são particularmente lesivas para as famílias de menores rendimentos. A saber, a existência generalizada de fenómenos de corrupção leva a que os cidadãos paguem mais impostos do que seria necessário e a que canalizem parte dos seus rendimentos para “subornos”, enquanto única via para poderem aceder a certos serviços públicos.
Se é certo que a corrupção não é propriamente um fenómeno mensurável, a verdade é que Kaufmann apresenta uma bateria de mais de 350 variáveis recolhidas por instituições locais que suportam as iniciativas que o Banco Mundial vem desenvolvendo nesta área.
Na mesma linha, a Transparência Internacional publica há já alguns anos os Índices de Percepção da Corrupção, um ranking que, relativamente ao ano de 2006, coloca a Finlândia como o País mais imune a este fenómeno, posicionando Portugal na 26ª posição, pouco atrás dos Estados Unidos e bastante acima de vários países da União Europeia (como a Itália, a Grécia, a Polónia ou a República Checa).
Estes indicadores nem são suficientemente confortáveis para desvalorizarmos iniciativas determinadas de combate à corrupção no nosso País, nem são excessivamente preocupantes para exigirmos, como se diria antigamente, “uma Maria José Morgado” em cada Paróquia…
Ainda assim, importava que do debate em curso sobre os caminhos para reforçar o combate preventivo e repressivo dos fenómenos de corrupção resultassem iniciativas concretas que pudessem produzir resultados visíveis e combater o mal pela raiz, elevando o risco dos infractores e assim desincentivando este tipo de comportamentos.
Para lá da discussão dos meios, da criação de entidades mais ou menos alegóricas e das decisões de alteração da organização das estruturas de investigação criminal que suscitam clara preocupação a qualquer pessoa minimamente atenta, deste debate teria necessariamente que resultar a criminalização do “enriquecimento ilícito” de funcionários e titulares de cargos públicos.
No Preâmbulo da Convenção das Nações Unidas já se expressava que “o enriquecimento pessoal ilícito pode ser particularmente nocivo para as instituições democráticas, as economias nacionais e o Estado de Direito”, o que foi reforçado no Artigo 20º. desta Convenção, que expressa que “com sujeição à sua Constituição e aos princípios fundamentais de seu ordenamento jurídico, cada Estado Parte considerará a possibilidade de adoptar as medidas legislativas e de outras índoles que sejam necessárias para qualificar como delito, quando cometido intencionalmente, o enriquecimento ilícito, ou seja, o incremento significativo do património de um funcionário público relativamente aos seus rendimentos legítimos que não podem ser razoavelmente justificados por ele”.
Ora, desde que salvaguardado o princípio Constitucional da presunção da inocência, ninguém aceitará com naturalidade que se retire à acusação o direito de utilizar a prova dos respectivos elementos do crime que consiga construir, designadamente, os rendimentos do investigado, o seu património e padrão de vida e, ainda, a flagrante desproporção entre um e outro, para demonstrar alguns que o crime não compensa.
A não ser assim, mais se corrobora o texto de Kaufmann, quando este sustenta que, para alguns, combater a corrupção é apenas uma forma de reagir às pressões públicas sobre esta matéria, com recurso a expedientes que mantêm tudo na mesma.

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