terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Quem quer um Imposto para a Saúde?


Caro Leitor,
Não querendo fazer papel de adivinho, visionário ou vendedor de ilusões, creio que lhe posso dar uma óptima notícia: apesar da conjuntura económica adversa e da eterna necessidade de disciplinar as contas públicas, o Governo Português vai baixar os impostos ao longo dos próximos anos!
Tal facto não se poderia depreender das habituais intervenções do Primeiro-Ministro ou do Ministro das Finanças que, à sua maneira, têm tentado incutir um sentido de rigor na gestão do Estado, mas a verdade é que parece encontrado o caminho para a redução dos Impostos sobre o Rendimento e, quem sabe, da própria taxa do IVA.
O segredo desta novidade genial pode ser extraído de duas palavras mágicas – “Imposto Consignado” – das quais decorrem múltiplas aplicações nos mais diversos contextos.
Aparentemente, a patente terá sido registada em nome da Comissão que está a estudar o financiamento do Serviço Nacional de Saúde (SNS), sob a forma de um Imposto para a Saúde – um contributo para a sustentabilidade do Sistema, a cobrar a cada cidadão em função dos seus níveis de rendimento.
De acordo com as notícias já vindas a público, esse imposto adicional seria voluntário numa primeira fase, mas passaria a compulsório caso as contas da Saúde se tornassem incomportáveis para os cofres do Estado.
Na prática, não se trata do comum aumento de impostos e sua posterior redistribuição por diferentes aplicações via Orçamento de Estado. Bem pelo contrário, pretende-se definir um mecanismo que garanta que o dito imposto (ou taxa, ou complemento, ou seguro público, ou o que mais se lhe queira chamar) será realmente canalizado para o sector da Saúde.
De acordo, por exemplo com a notícia do Diário Económico de há algumas semanas, a intenção da Comissão é que o mesmo seja de adesão voluntária, através da. criação de “um seguro complementar público, em que coberturas adicionais são garantidas contra o pagamento de contribuições, eventualmente ligadas ao rendimento, dos beneficiários que escolham esta cobertura complementar”. No entanto, se a situação das contas da Saúde se mantiver no vermelho, a dita Comissão recomenda ao Governo que lance um novo imposto dedicado exclusivamente à Saúde.
Como curiosidade, refira-se que de entre as vantagens apontadas pela Comissão para este dissimulado aumento de Impostos se aponta a “menor resistência da população” face ao encaminhamento directo das verbas para um sector tido por prioritário.
Pela mesma lógica, não tardarão a chegar o Imposto para a Educação, o Imposto para a Cultura, o Imposto para a Segurança, o Imposto para o Ambiente e outras mais tributações consignadas que atenuem a dita “resistência da população”…
Ainda sobre esta proposta, se é verdade que o Ministério da Saúde se apressou a desmentir a intenção de adoptar esse novo Imposto logo que a notícia saiu, em meados de Janeiro último, o próprio Ministro admitia esta possibilidade na entrevista que deu ao Público no Verão passado.
Em todo o caso, o que parece indesmentível é que o País continua a precisar de identificar um caminho claro para garantir a sustentabilidade do SNS, seja ou não no respeito pelo preceito constitucional que sustenta que este deve ser “tendencialmente gratuito”.
Isto porque, ao longo dos últimos anos, foi evidente o descalabro do Sistema, cujos custos já atingem os 10% do PIB, um valor superior a outros Países da União, e ao qual não está associada uma prestação de serviços com a qualidade desejada.
Neste período, quer com Luís Filipe Pereira, quer com o actual Ministro Correia de Campos, foram múltiplas as medidas introduzidas com vista à racionalização da despesa.
Com o primeiro, avançou a reorganização das urgências hospitalares, definiram-se as bases de uma tabela de preços de referência para os actos médicos, implementou-se um Sistema de Conferência de Facturas e de um Sistema de Comunicação em Rede, procedeu-se à definição dos Preços de Referência dos Medicamentos, criaram-se incentivos à prescrição pela denominação comum internacional, assistiu-se ao reforço da quota de mercado dos Genéricos, aprovou-se a Lei da Gestão Hospitalar, procedeu-se à empresarialização de 31 hospitais e à preparação das parcerias público-privadas para a construção/gestão de 10 novos Hospitais e de uma nova Lei para os Centros de Saúde.
Com o actual Ministro, impuseram-se limites à subida do preço dos medicamentos, tentou-se dominar o crescimento dos gastos com remédios nos hospitais (restringindo a compra de medicamentos inovadores), mudou-se o sistema de gestão hospitalar, aumentou-se o valor das taxas moderadoras, encerraram-se urgências e maternidades, mexeu-se nas horas extraordinárias dos médicos e introduziram-se formas efectivas de controlar a assiduidade dos funcionários.
Apesar de este ano não ter havido necessidade de um orçamento rectificativo, mais pela generosidade da dotação inicial do que pela especial contenção da despesa, este esforço de rigor na gestão dos dinheiros públicos na Saúde está longe de ser concluído.
E, só então, faz sentido pensar em atacar o lado da receita, se não se quiser alterar a própria estrutura do Sistema, permitindo o reforço do grau de liberdade de escolha dos cidadãos.

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