terça-feira, 15 de março de 2011

Um País sem futuro?


Há cerca de três meses, e na sequência da “Greve Geral” de Novembro último, questionei neste espaço a real abrangência, a razoabilidade dos fundamentos e a utilidade de tal protesto que, como se poderá recordar, tinha como pano de fundo a contestação às “Políticas de austeridade”.
Como então escrevi, tal greve “estava à partida condenada ao insucesso, não tanto pelo número de participantes, mas pela irrelevância do seu impacto na alteração das políticas públicas (tanto mais que os desmandos dos Governos socialistas dos últimos 15 anos e os desperdícios colectivos que protagonizámos enquanto Nação vão ter um preço claro a pagar nos próximos anos)”.
Daí que considerasse que “mais do que um protesto ou reivindicação, esta greve foi a afirmação de um estado de alma, de todos quantos quiseram dizer que não são felizes”.
Como será fácil compreender, não deixa de ser possível estabelecer um paralelismo a esses níveis entre a referida “Greve Geral” e as manifestações nacionais da “Geração à Rasca”, que tiveram lugar no passado Sábado.
Começando pela abrangência, é certo que merece relevo a capacidade de mobilização de uma organização “não estruturada”, porquanto não foi assente em qualquer entidade sólida, de cariz partidário, sindical ou associativo, tendo antes surgido da iniciativa espontânea de alguns cidadãos e da sua disseminação através das redes sociais.
Sem entrar na discussão em concreto do número exacto de milhares que marcaram presença nas iniciativas que ocorreram um pouco por todo o País – a menor das estimativas é ainda uma cifra significativa -, nem sequer na desvalorização desnecessária associada à presença de um número considerável de manifestantes menos jovens, a verdade é que os protestos reuniram motivações extremamente difusas.
Afinal, à versão “oficial” da contestação pelas dificuldades de acesso ao emprego dos jovens ou pela sua precariedade, juntou-se o protesto contra o actual Governo, contra o sistema político e os partidos, contra a corrupção, pela anarquia, pelos serviços públicos, pela educação, pela saúde, pelas reformas e por toda uma série de outras causas igualmente legítimas.
Ora, centrando-me nas motivações iniciais do protesto, a verdade é que as mesmas são redutoras face aos atributos da generalidade da população jovem deste país, bem ilustradas nos muitos exemplos com que contacto diariamente, dentro e fora do meio académico.
A mais qualificada das gerações - e reporto-me a verdadeiro conhecimento e não (apenas) a níveis de educação formal – não pode ficar associada a uma imagem de acomodação inerente à obtenção de um “emprego estável para a vida toda” com um “salário compatível com o nível de vida actual”, nem deixar-se sequer rotular pelo triste epíteto de “geração à rasca”.
Neste particular, não se trata de negar que uma parcela esmagadora de jovens, mesmo os mais qualificados, tem dificuldade de conseguir uma colocação profissional e que, de entre aqueles que o conseguem, é também elevada a percentagem dos que auferem um salário baixo (pouco acima do salário mínimo nacional) e dos que se encontram em situações contratuais instáveis.
Ora, se a “instabilidade laboral” é um enorme contributo para a instauração de um regime meritocrático em qualquer contexto – com o que isso potencia para um País ao nível cultural e económico -, nas circunstâncias económicas e sociais actuais é ainda mais defensável a existência de empregos precários face à impossibilidade de acesso alternativo ao mercado de trabalho.
Aliás, a estabilidade do emprego não pode ser já um valor em si mesmo e, em boa verdade, jamais o voltará a ser.
Por outro lado, a verdade é que nem esta geração, nem cada um dos seus membros de per si, está verdadeiramente à rasca, no sentido de se encontrar numa situação sem solução.
Quase sem excepção, qualquer um dos nossos jovens sabe que o espera um presente bem melhor e um futuro com muito maiores perspectivas (ainda que sem os requisitos que aqui parece reivindicar) se se dispuser a atravessar as fronteiras e seguir o caminho de muitos outros da mesma geração que os antecederam (ou, no mínimo, a mover-se dentro do nosso território).
O que traz à evidência que quem se encontra verdadeiramente à rasca não são os jovens desta geração, é o País que não lhes consegue oferecer qualquer oportunidade de se afirmarem, de constituírem as suas famílias e de contribuírem com as suas capacidades e energia para o seu desenvolvimento, assim abdicando do seu próprio futuro, abrindo-lhes as portas de saída.
Neste âmbito, as manifestações do passado Sábado, não serviram sequer para pôr a nu essa evidência, de tal forma a generalidade das famílias portuguesas tomou consciência dela, da forma mais dura, ao longo dos últimos anos.
Mas podem ter servido para mostrar a essa geração a força da sua mobilização e a oportunidade que tem para se transformar em força de mudança, não contra o regime em vigor, mas através dele.

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