sexta-feira, 28 de maio de 2010

A hora dos Empresários


"Nunca o país, desde 1974, precisou tanto do contributo dos empresários privados para vencer a crise em que nos encontramos".
Tal como foram transcritas em vários órgãos de comunicação social, estas terão sido as palavras proferidas pelo Presidente da República, Cavaco Silva, no final de um encontro com 56 figuras do mundo empresarial e académico da região Norte, que teve lugar no passado Sábado.
Mas o Presidente da República voltou a puxar dos seus galões de economista para acrescentar algum pragmatismo ao repto antes lançado. Assim, Cavaco Silva pediu aos empresários para “fazerem um esforço acrescido para continuarem a investir” e para “procurarem, eventualmente fora da Europa, mercados para colocar os seus produtos”, nunca descurando a “aposta na qualidade e na inovação".
Numa altura em que o País ostenta, mais que as feridas abertas de uma crise financeira - que, independentemente da conjuntura e das afinidades, tem raízes predominantemente domésticas -, as cicatrizes de um processo estrutural de perda de competitividade e potencial de crescimento, este discurso suscita várias reflexões.
Comecemos pelo óbvio: mais do que um problema orçamental na esfera pública, o País no seu todo atingiu um grau tal de endividamento e de quebra na poupança colectiva que a sua sustentabilidade futura exigirá uma enorme disciplina financeira a todos os agentes económicos (quer na gestão dos recursos de que dispõem, quer na componente de gestão dos créditos antes contraídos, sempre que os mesmos carecerem de uma renovação que não se vai revelar facilitada).
Neste contexto, todas as possibilidades de impulso ao crescimento económico do País por via de aumentos lineares da Despesa serão praticamente inexistentes: o Estado tem que emagrecer e cortar desperdícios na despesa corrente e racionalizar a sério os investimentos públicos, privilegiando aqueles que tiverem efeitos reprodutivos na economia ou que assegurem melhorias críticas do bem-estar dos cidadãos; os particulares verão o seu rendimento disponível reduzir-se significativamente (pelo aumento do desemprego, pelo aumento dos impostos, pelo corte em regalias sociais, pelo aumento dos juros, …) vendo-se forçados a contrair o consumo; mesmo as empresas terão algumas dificuldades em aumentar o nível de investimento por via das restrições existentes no acesso ao crédito.
Sobra, pois, a componente da Balança Comercial, com vários factores a onerarem as nossas importações (com um custo em alta e com uma forte rigidez face ao padrão de activos que as compõem) e com uma contínua perda de competitividade das nossas exportações (pese embora o notável esforço de reestruturação sectorial que as mesmas ilustram nas últimas décadas).
Neste cenário, poderíamos porventura deitar a “toalha ao chão” ou optar por olhar para vários exemplos, internos e externos, de circunstâncias em que foi possível contornar o aparente fatalismo da História.
E, nesta segunda hipótese, os empresários têm um papel verdadeiramente crucial, no rigor, na qualidade da gestão, no planeamento, na visão estratégica, na mobilização dos seus recursos (materiais, imateriais e humanos), para que muitos parecem não estar preparados.
Se se exige que o Estado remova os entraves à normal actividade económica (entre outros aspectos, criando bases legais estáveis e claras nos diversos domínios, dando eficácia à Justiça e à Administração Pública ou cumprindo com os seus prazos de pagamento), não podemos alimentar uma lógica de mero proteccionismo ou assistencialismo público.
Se se precisa de um esforço e entrega acrescido dos colaboradores e, até, de uma maior flexibilidade no mercado laboral e nos vários domínios concomitantes, é preciso desenvolver políticas de motivação do seu desempenho, de real reforço das suas competências e de protecção nos casos de eventuais dificuldades circunstanciais.
E precisamos, claro, de verdadeiros empresários, socialmente responsáveis, arrojados mas conscientes, com horizontes alargados (muito para lá das fronteiras do nosso quintal), com espírito empreendedor e capacidade de inovação, com uma visão de médio longo prazo e com uma forte capacidade de motivação e congregação de esforços e capacidades.
No fundo, empresários que saibam ser o modelo de referência para aquilo de que as suas empresas, os seus sectores de actividade, as suas regiões e o País verdadeiramente precisam para voltarem aos trilhos do sucesso.

domingo, 23 de maio de 2010

Sem Travões


O País acordou para a presente semana sob a sugestão de Angela Merkel e do Ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, para que os Estados-membros da Zona Euro incluam nas respectivas Constituições disposições semelhantes à existente na Alemanha, tendentes à imposição de limites ao défice público (e/ou à dívida pública).
Imediatamente secundada pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros Português em entrevista ao Diário Económico, a proposta suscitou reacções heterogéneas da parte dos Partidos e dos analistas.
Ora, entre outras, podem colocar-se as 3 seguintes questões: a utilidade, a exequibilidade e a responsabilidade associada à imposição formal de tais limites.
No primeiro caso, parece-me claro que a adopção de tal dispositivo não pretende ter um efeito prático de limitação (a uma qualquer situação concreta em que os valores pudessem estar em risco de ser ultrapassados) mas procura funcionar antes como um testemunho de compromisso para com esse objectivo.
A inclusão de tais metas de natureza contabilístico-financeira num documento como a Constituição serviria então para manifestar o relevo que lhes seria atribuído pelos Estados/Governos em questão, funcionando como meio de enfatizar as políticas prosseguidas tendo em vista tal desiderato.
Tratar-se-ia, pois, de uma questão de credibilização da conduta governativa, numa ideia muito enquadrada pela visão da Europa não Mediterrânica de que as leis (incluindo a Constituição) são para ser cumpridas.
Quanto à questão da exequibilidade, é fácil imaginar o que se passaria no nosso País perante uma situação de eventual ultrapassagem de tais limites.
Desde logo, numa base de verificação do défice real/dívida pública acumulada no final de um determinado ano, e independentemente do que tivesse sido previamente orçamentado, poder-se-ia sempre invocar que tais resultados teriam resultado de uma conjuntura económica adversa, dificilmente antecipável aquando da construção do Orçamento anterior.
Já em relação ao Orçamento subsequente, a ultrapassagem do valor do défice/dívida e a aplicação efectiva do preceito Constitucional, transformaria um mecanismo-travão de disciplina das Contas Públicas numa verdadeira e apertada grilheta com a qual Partido algum, do poder ou Oposição, quereria ficar associado.
Depois dos Governos de iniciativa Presidencial, passaríamos assim a ter os Orçamentos de iniciativa Presidencial (ou a ver o Presidente delegar tal tarefa no Banco de Portugal ou no Tribunal de Contas ou, eventualmente, a ser assumida tal função pela tecnocracia da União Europeia -algo não muito diferente do que aconteceu na passada semana).
Sobra então a questão da responsabilidade. Necessariamente, perante uma situação de violação de tal preceito constitucional teria que ser apurada a responsabilidade política e legal pelo resultado obtido.
Ora, com ou sem os ventos favoráveis da conjuntura económica, cabe ao Governo "fazer executar o Orçamento de Estado" nos termos da dita Constituição (Art.º. 199º) pelo que teria que ser precisamente o Governo a ser responsabilizado por tal circunstância.
E, pergunta-se, poderia um Governo continuar em funções depois de violar a Constituição? Estaria então a ser assegurado o "regular funcionamento das instituições democráticas"?
E, se não for esse o entendimento, como avaliam o desempenho do actual Governo aqueles que defendem hoje a adopção de tais disposições?

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Portugal visto do relvado


Se quisermos fazer uma ligação entre a realidade futebolístico-desportiva e a situação económica, financeira e social do País, em particular numa semana como esta, temos que começar pelo essencial: o Benfica foi campeão, 6 milhões de Portugueses estão hoje mais felizes, mais motivados, mais produtivos e Portugal terá mesmo ganho várias posições nos rankings de competitividade internacionais.
Graças, entre outros, a Jesus, Luisão, Aimar e Cardozo são hoje mais toleráveis as medidas acrescidas de austeridade que o Governo vai ter que implementar, os aumentos de impostos, os cortes nas prestações sociais, a suspensão inadiável do lançamento de novos projectos de investimento.
Bem vistas as coisas, os investimentos verdadeiramente importantes para a opinião pública são os milhões pagos por Gaitán e se há investimento que deve ser travado é aquele que os grandes clubes europeus querem fazer por Di Maria, Saviola ou David Luiz.
A este propósito, não deixa de ser curioso que esta conquista acabe por corroborar a visão Socrática da gestão financeira da coisa pública, em que o investimento se assume como alavanca maior para o sucesso e acaba por criar mecanismos de auto-sustentação dos resultados (apenas com o pequeno pormenor de que estes mecanismos não são perceptíveis no campo de intervenção do actual Primeiro-Ministro).
Perante tais evidências, a lógica da vida austera e de sacrifício, o apelo à poupança e à contenção financeira pode mesmo sofrer um forte abalo, desenhando-se um novo impulso consumista que mais contribua para o desejado aumento das receitas do IVA.
Ainda a propósito desta conquista e, nomeadamente, dos festejos que a sucederam, ignoremos a soberba de alguns vencedores e centremo-nos na intolerância crescente de muitos vencidos, com consequências que voltaram a demonstrar a progressiva degradação das instituições. Afinal, parece que nem em cenários perfeitamente antecipáveis as forças de segurança conseguem garantir o cumprimento da sua missão e assegurar a ordem pública e a protecção de pessoas e bens.
Mas a principal reflexão que hoje resulta da análise do panorama futebolístico nacional prende-se precisamente com um aspecto de índole económica, referente aos indicadores de desenvolvimento do território.
Houve um tempo em que o mapa da divisão máxima do futebol nacional esteve sobretudo pintado com as cores do Norte, com o claro domínio dos filiados das Associações de Futebol do Porto e Braga (os quais chegaram a ter a maioria qualificada dos participantes na competição).
Nesse tempo, ainda que com algumas oscilações naturais e sucessivas mudanças de protagonistas, emergia a participação de vários clubes cuja sustentação resultava da capacidade de investimento de um ou mais empresários locais, normalmente ligados ao tecido industrial.
Quem não recorda o “desaparecimento” do Algarve do mapa do escalão principal, a contínua ausência do Alentejo, a esparsa presença dos clubes do Centro (depois da queda de vários clubes com enorme historial nos escalões secundários) e mesmo a concentração dos clubes do Sul na Grande Lisboa (Sporting, Benfica, Belenenses – bastas vezes salvo sobre a linha de meta – Amadora e Setúbal)?
Na próxima época, serão apenas 5 os clubes do Norte a marcar presença na Liga Sagres: Porto, Rio Ave, Paços de Ferreira, Braga e Guimarães. O Centro surge com quatro presenças (Beira Mar, Naval, Académica e U. Leiria), o Sul tem também cinco representantes, dois dos quais Algarvios (Benfica, Sporting, Setúbal, Olhanense e Portimonense), a Madeira mantém os seus dois clubes actuais (Marítimo e Nacional).
Poderá parecer uma análise simplista, mas a verdade é que esta evolução não diverge muito da quebra de competitividade e riqueza no Norte do País face ao resto do território.
Note-se que, mesmo na Liga Vitalis, eram equipas do Centro (Oliveirense e Feirense) e Açores (Santa Clara) os demais candidatos à promoção. Até Trás-os-Montes volta a perder o seu representante nos escalões profissionais de futebol, logo no ano em que o Chaves consegue um dos maiores feitos do seu historial.
Por tudo isto, não tendo muito a concordar que o S. C. Braga fez mais pela regionalização do que muitos estudos técnicos ou declarações políticas. Mas pode ter demonstrado que o caminho para o Norte passa também pela criação de uma rede multipolar de cidades médias, capaz de alavancar novos pólos de competitividade e dinamização económica.
Dentro e fora das quatro linhas, só uma outra postura e ambição pode reverter o caminho de perda que ora se vem percorrendo…

sexta-feira, 7 de maio de 2010

José contra o vulcão


Na Europa e no mundo, o centro das atenções públicas das últimas semanas caiu sobre as implicações da erupção do vulcão islandês Eyjafjallajokull sobre o tráfego aéreo internacional.
Como então foi possível observar, esse fenómeno natural provocou situações verdadeiramente impensáveis para milhares de cidadãos e até para Chefes de Estado, com as incidências vividas entre outros por Cavaco Silva e Angela Merkel no regresso aos seus países de origem após visitas oficiais ao estrangeiro.
Com os voos cancelados, como então sucedeu, ou a voarem “baixinho” – para não se acordar o vulcão Katla (vizinho do Eyjafjallajokull e bastante mais potente) -, foi possível ouvir outras erupções mais comuns, mas igualmente devastadoras para os seus potenciais alvos, vindas directamente da efervescência dos mercados financeiros.
Aqui, a lava começou por atingir a Grécia mas a nuvem de cinzas rapidamente alastrou pelo Mediterrâneo e acabou por atingir a Espanha e Portugal, neste caso com a violência visível na descida de dois níveis no rating da nossa dívida pública junto da Standard & Poor’s, de A+ para A-.
Na altura, esse fora o corolário de dias entusiasmantes em que Portugal galgou, a igual velocidade, posições no ranking da FIFA e na lista dos países com maior risco de incumprimento a nível mundial. No primeiro caso, batendo potências como a Holanda, a Itália, a Alemanha, a Argentina ou a Inglaterra. No segundo, ultrapassando especialistas como o Líbano, o Iraque, ou a “falida” Islândia.
É aqui que surge o herói da nossa história, num momento cujos contornos tem enormes semelhanças com o filme protagonizado por Tom Hanks no início da década de 90.
Tal como José, Joe Banks (a personagem assumida por Tom Hanks) tinha um emprego numa empresa que se ocupava a fazer malfeitorias aos seus clientes, através de práticas odiosas e desumanas.
Quando lhe é diagnosticada uma doença fatal que só lhe possibilitará mais alguns meses de vida, Joe aceita o desafio de um magnata, disponibilizando-se para saltar voluntariamente para dentro de um vulcão na ilha de Waponi Woo, de forma a apaziguar o Deus do vulcão e a pacificar os habitantes da ilha.
Perante a pré-anunciada oclusão da sua actividade governativa, quer pelas dores provocadas pelos sintomas internos do partido que o suporta, quer pelos diagnósticos contundentes dos mais reputados especialistas nacionais e internacionais, José disponibiliza-se também para a tarefa heróica de um sacrifício em prol do apaziguamento do vulcão financeiro.
Depois de 5 anos de desvarios, de simulacros reformistas, de despesismo e de artificialismos, José propõe-se deixar uma última marca que possa inverter o curso da história e devolver ao País o rumo da esperança, do crescimento e, até, do rigor orçamental.
Decidido, ouve os avisos do seu vizinho Aníbal, segue os conselhos do seu colega Fernando, acata as ameaças que lhe chegam de fora dos colaboradores do José Manuel. Procura em Pedro e Paulo os apoios que lhe possam dar força para o caminho, na certeza de que será seguramente criticado por Francisco e Jerónimo, que continuam a viver (ou a fazer os outros crer que é possível viver) num mundo de ilusões.
Lá fora, continua a ouvir-se o ruído ensurdecedor das vozes que sussurram: “-És o próximo! Vais cair! Não te safas!”, ao mesmo tempo que vê da janela uma Europa nervosa a dar a mão a uma Grécia já de joelhos e a pedir clemência.
Ainda mais determinado, calça as sapatilhas com que fez jogging na Praça Vermelha e guarda na mochila de viagem a versão encadernada do PEC. Num segundo impulso, passa os olhos pelos estudos que sustentam os seus mega-projectos de investimento mas acaba por levar consigo apenas a análise de viabilidade económica da auto-estrada do Centro.
Reconfortado, chama os órgãos de comunicação social amigos para fazerem a cobertura deste momento histórico e inicia a escalada da montanha.
Já com o povo em êxtase, José vira-se para a multidão e dispõe-se a dizer umas últimas palavras: “-Vulcão? Qual Vulcão?

terça-feira, 4 de maio de 2010

A boa Gestão

Se quisermos definir um indicador o mais directo possível da qualidade de um gestor, teremos que nos centrar naquele que é o propósito último da sua actividade no seio de uma empresa ou de qualquer outra entidade: a capacidade de criar valor.
Como resulta desta ideia, essa capacidade pode não se traduzir (unicamente) na obtenção de bons resultados económicos e financeiros, sendo antes relevada pela forma como tal empresa ou organização interage com as suas diferentes contrapartes, internas ou externas.
Uma vez consciente de tal facto, o gestor deverá começar por estipular o caminho que pretende seguir na referida criação de valor: será através da qualidade dos seus produtos ou serviços? Será através da relação de proximidade com os seus clientes? Será através das condições de trabalho proporcionadas aos seus colaboradores? Será através de um exercício dinâmico de uma efectiva responsabilidade social empresarial?
Por esta via, será possível definir a missão, os valores e a orientação estratégica da referida empresa ou organização, os quais, acabarão por reunir uma súmula de diferentes prioridades que devem nortear sempre todas as suas opções e acções futuras.
Numa óptica estrita da gestão do negócio ou da actividade, é também fundamental dotar-se de um conhecimento profundo da realidade envolvente e das próprias características/recursos da organização, sob as mais diversas perspectivas, assim adquirindo um superior controlo sobre os factores críticos para o sucesso.
È então altura de assumir metas, devidamente quantificadas e calendarizadas, e de traçar caminhos, identificando os recursos necessários à prossecução dos objectivos estabelecidos e, com igual clareza, a fonte e o timing que conduzirão à sua aquisição.
A exaustividade e o rigor da informação aí expressa e, de forma não menos importante, a ambição e o desafio constantes de tal Plano, traduzem-se em requisitos fundamentais deste guia da navegação, o qual requer igualmente a transparência e disseminação da informação no seio da organização e o compromisso de todas as áreas / colaboradores.
Neste particular, possuir uma visão integrada, ser capaz de protagonizar uma liderança forte e motivadora e polvilhar com uma quantidade significativa de bom senso todas as decisões e iniciativas são igualmente requisitos para a melhoria da qualidade da gestão.
Seguir-se-á o desenvolvimento e implementação de capazes mecanismos de controlo e monitorização, aptos a permitir a detecção de problemas, o potenciar de oportunidades e o ajustamento flexível do conjunto da organização à luz de novos condicionalismos internos ou externos.
Em suma, há que antecipar, conhecer, prever, planear, fazer, medir, controlar e corrigir e outros tantos verbos que se querem assumir como sinónimos de bem gerir ou de empreender.
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